As sem-razões do amor
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.
A UM AUSENTE
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.
Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?
Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.
Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
DIÁRIO DE BORDO: UMA SOCIEDADE DE AMIGOS
Jorge Bichuetti
Hoje, sinto que a vida corre e intempestiva, fabrica novos horizontes.
Não dominamos as cartas do destino, pois as correntes nos arratam e nela navegamos sem auscultar os valores éticos e estéticos da nossa utopia.
Para onde vamos?...
O homem pode se reconhecer inacabado, projeto, uma multidão de tarefas e refazer-se e reinventar o mundo
( Aqui, estou... A Lua não entende minhas preocupações... Li, ela ouviu , e deitou-se nos meus pés...
Acho que ela deseja que lhe explique, usando as mãos para que sinta no idioma do carinho meus pensamentos humanos.)
Talvez, amigo, eu não me entenda, de fato: tentarei falar como se estivéssemos numa mesa de café com pão-de-queijo, broas e café.
Pode o homem descobrir-se vida nova, numa caverna tecnológica, iludido pelo apogeu dos inventos e se crendo, convocado a viver à espera de um troféu?!...
Como inventar-se uma novidade atolado numa máquina fascista de programação de desejos e demandas, onde não ouve a voz do vento e não sente a carícia do rorvalho?!...
Necessitamos de construir uma sociedade de amigos para enfrentar com valentia e fortaleça os muitos e vitaminados projetos de captura e, igualmente, criar de linhas de produção de vida, do novo do diferente, da ousadia que reinventa o homem e o mundo...
( A lua começa entender... Isso lhe agrada.)
Sozinhos, fragilamos nossa capacidade de resistência e somente conseguimos um pouco de resilência.
Num coletivo vertical, morremos por falta de autonomia e excesso de poderes; mas, numa sociedade de amigos, revitalizamos os sonhos e potencializamos a potência disruptiva da solidariedade e partilha.
Ai, conseguimos seguir...
Hoje, sinto que a vida corre e intempestiva, fabrica novos horizontes.
Não dominamos as cartas do destino, pois as correntes nos arratam e nela navegamos sem auscultar os valores éticos e estéticos da nossa utopia.
Para onde vamos?...
O homem pode se reconhecer inacabado, projeto, uma multidão de tarefas e refazer-se e reinventar o mundo
( Aqui, estou... A Lua não entende minhas preocupações... Li, ela ouviu , e deitou-se nos meus pés...
Acho que ela deseja que lhe explique, usando as mãos para que sinta no idioma do carinho meus pensamentos humanos.)
Talvez, amigo, eu não me entenda, de fato: tentarei falar como se estivéssemos numa mesa de café com pão-de-queijo, broas e café.
Pode o homem descobrir-se vida nova, numa caverna tecnológica, iludido pelo apogeu dos inventos e se crendo, convocado a viver à espera de um troféu?!...
Como inventar-se uma novidade atolado numa máquina fascista de programação de desejos e demandas, onde não ouve a voz do vento e não sente a carícia do rorvalho?!...
Necessitamos de construir uma sociedade de amigos para enfrentar com valentia e fortaleça os muitos e vitaminados projetos de captura e, igualmente, criar de linhas de produção de vida, do novo do diferente, da ousadia que reinventa o homem e o mundo...
( A lua começa entender... Isso lhe agrada.)
Sozinhos, fragilamos nossa capacidade de resistência e somente conseguimos um pouco de resilência.
Num coletivo vertical, morremos por falta de autonomia e excesso de poderes; mas, numa sociedade de amigos, revitalizamos os sonhos e potencializamos a potência disruptiva da solidariedade e partilha.
Ai, conseguimos seguir...
NATAL
Jorge Bichuetti
Noite Feliz! Belém! Nasce um homem encantado chamado Jesus de Nazareth, porém, poderia ter sido nomeado O Homem-Amor... Amor Incondicional, amor sempre, demasiado amor...
Uma mensagem viva da paz, da não-violência, dos direitos humanos, e da opção radical pelos oprimidos...
Natal: simplicidade e ternura, generosidade e partilha... Solidariedade amorosa que nos levam a romper com os muros egoístas do individualismo e com os mecanismos fascistas de exclusão...
Hoje, celebramos seu nascimento, divorciando-se de sua vida.
Criamos presépios de neón e luxo, esquecidos dos meninos que sofrem as agruras da noite fria nas calçadas do abandono... Eles revivem o Cristo nas manjedouras pós-modernas e ali os abandonamos, relegados as intempéries de um calvário cruel e sangrento.
Mergulhamos no consumismo, e gastamos enlouquecidos; e não recordamos dos que padecem na miséria, na solidão e no desamor deste mundo de acumulação e superficialidades, de competição e de fome.
Ele nasceu numa manjedoura e morreu numa cruz... Caminhou, amando... Serviu sempre...
Dele, nos recordamos, contudo, no festival dos vendedores e vencedores da subjetividade capitalista; e o aprisionamos nas ilusões do mundo; negando sua promessa de um novo reino de misericórdia e compaixão, convivência fraternal e cuidado do outro.
Não o permita crucificado, de novo, pela nossa displicência e negação; aceitemo-lo no seu convite de vida nova, novos olhares e novas relações, amor pleno e partilha solidária.
Neste Natal... Abrace, irmane-se...
Supere preconceitos e distâncias... Acerque-se do outro: seque suas lágrimas e nos bailado do carinho descubra os sorrisos perdidos ou subtraídos...
Viva seu Natal, vendo o mundo e se afetando com as injustiças, nEle, descobrindo forças e coragem para indignar-se e rebelar-se, lutando, então, por uma nova vida de solidariedade e paz...
Não permita um Natal sem amor.
Ame.
Ame e caminhe, para além das ilusões consumistas...
Ame e sirva, para além do individualismo burguês...
Ame, sem fronteiras... Ame desbrando o nascer de um novo dia...
Expulse de si a moral de culpa e ressentimento, a ideologia da exlclusão e o narcisismo que nos limta e entorpece nossa potência de vida.
Celebre o Natal, mas não se esqueça de Ele, a Vida Celebrada, era e é, na suas v´sceras um eloqënte e sinfônico chamado ao amor e à solidariedade.
Noite Feliz! Belém! Nasce um homem encantado chamado Jesus de Nazareth, porém, poderia ter sido nomeado O Homem-Amor... Amor Incondicional, amor sempre, demasiado amor...
Uma mensagem viva da paz, da não-violência, dos direitos humanos, e da opção radical pelos oprimidos...
Natal: simplicidade e ternura, generosidade e partilha... Solidariedade amorosa que nos levam a romper com os muros egoístas do individualismo e com os mecanismos fascistas de exclusão...
Hoje, celebramos seu nascimento, divorciando-se de sua vida.
Criamos presépios de neón e luxo, esquecidos dos meninos que sofrem as agruras da noite fria nas calçadas do abandono... Eles revivem o Cristo nas manjedouras pós-modernas e ali os abandonamos, relegados as intempéries de um calvário cruel e sangrento.
Mergulhamos no consumismo, e gastamos enlouquecidos; e não recordamos dos que padecem na miséria, na solidão e no desamor deste mundo de acumulação e superficialidades, de competição e de fome.
Ele nasceu numa manjedoura e morreu numa cruz... Caminhou, amando... Serviu sempre...
Dele, nos recordamos, contudo, no festival dos vendedores e vencedores da subjetividade capitalista; e o aprisionamos nas ilusões do mundo; negando sua promessa de um novo reino de misericórdia e compaixão, convivência fraternal e cuidado do outro.
Não o permita crucificado, de novo, pela nossa displicência e negação; aceitemo-lo no seu convite de vida nova, novos olhares e novas relações, amor pleno e partilha solidária.
Neste Natal... Abrace, irmane-se...
Supere preconceitos e distâncias... Acerque-se do outro: seque suas lágrimas e nos bailado do carinho descubra os sorrisos perdidos ou subtraídos...
Viva seu Natal, vendo o mundo e se afetando com as injustiças, nEle, descobrindo forças e coragem para indignar-se e rebelar-se, lutando, então, por uma nova vida de solidariedade e paz...
Não permita um Natal sem amor.
Ame.
Ame e caminhe, para além das ilusões consumistas...
Ame e sirva, para além do individualismo burguês...
Ame, sem fronteiras... Ame desbrando o nascer de um novo dia...
Expulse de si a moral de culpa e ressentimento, a ideologia da exlclusão e o narcisismo que nos limta e entorpece nossa potência de vida.
Celebre o Natal, mas não se esqueça de Ele, a Vida Celebrada, era e é, na suas v´sceras um eloqënte e sinfônico chamado ao amor e à solidariedade.
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
SOCIEDADE DE AMIGOS: POETAS, NOVA GERMINAÇÃO
MINHA POÇA
Pablo Cecílio
Uma poça mais menos grande e suja, era casa de girinos, larvas de libélulas e duas espécies de peixes.
Pablo Cecílio
Uma poça mais menos grande e suja, era casa de girinos, larvas de libélulas e duas espécies de peixes.
Pouca coisa me parecia tão interessante quanto aquela poça que quase fedia em meu quintal.
Logo, beber ao lado do feminino encanto ultrapassará minha poça na lista de prioridades. Toda energia gasta no mantimento do equilíbrio do eco sistema, agora, canalizava-se no imenso esforço de harmonizar a mesa de bar. Lidar com a bohêmia não era muito diferente da administração da poça.
Os peixes e girinos lentamente me conduziam ao autismo, o álcool me fazendo pensar alto e mesmo contra minha vontade manipulava meus lábios, simulando um sorriso, sucesso. Minha lista de amigos sai de 2 pra 20. Sou o rei do bar.
Minha poça quase seca quando orgulhoso levei Ana pra conhecer meu quintal. Ao pisar na minha grama-capim a moça levou os dedos ao rosto tampando as duas narinas. Ela não identificara a origem do cheiro, e, enquanto, Ana olhava ao redor de meu quintal, atônita, eu temendo que ela se manifestasse, disse: - Esse quintal precisa de um trato! Ela balançou a cabeça concordando enquanto eu a puxava pelas mãos rumo a sala. Um sentimento único tomou conta de mim, e após 2 calafrios e um olhar penetrante, resolvi limpar meu quintal.
Aquela poça viva que nunca incomodara mamãe ou minha irmã, agora inviabilizava meu namoro.
Churrascos longos e regados a inesgotáveis piadinhas aconteciam no meu novo jardim, esse era o caminho a seguir, ninguém tinha duvida.
Ana me ensinou a dar presentes e abraçar com ternura. Lentamente, me socializou sem o álcool.
Ana virou Fernanda, que virou Paula, nada mais me parecia irreparável. Até que numa virada de ano minha irmã indignada ao receber um fraco abraço seguido de pequenos tapinhas me perguntou: Porquê você abraça assim? Respondi calado com um sorriso amarelo que ela entendeu. Pensei: É pra não secar o resto da poça que ainda resta em mim.
AUTO-MISERICÓRDIA
Josiane Sousa
Foste, com tuas pernas lânguidas
No sofregante atordeio da alma,
Imploraste o perdão a si mesmo.
Foste, na velocidade de língua de serpente
Redimir-se de teus cheiros exalados de volúpia,
Que enrubresceram tua face.
Foste, no silêncio de alquimia dos bosques,
Buscares o perfume salvo santo
Das narinas porosas e asfixiantes.
Foste, e ao ir, partiste de mim
Como água que me debruça
Para que lentamente eu despeje
Essa efervescência de você.
No sofregante atordeio da alma,
Imploraste o perdão a si mesmo.
Foste, na velocidade de língua de serpente
Redimir-se de teus cheiros exalados de volúpia,
Que enrubresceram tua face.
Foste, no silêncio de alquimia dos bosques,
Buscares o perfume salvo santo
Das narinas porosas e asfixiantes.
Foste, e ao ir, partiste de mim
Como água que me debruça
Para que lentamente eu despeje
Essa efervescência de você.
POESIA: ASAS DO AMANHÃ
HOJE...
Jorge Bichuetti
Hoje, o mundo ainda sombrio
me asfixia e me enlouquece,
num torpor de desalento e morte;
mas, nas entrelinhas das lágrimas,
antevejo o amanhã e, então,
já não choro descontente
as dores deste desencanto...
Caminho, apurando o passo,
como quem já enxerga
num fiapo de luar
os encantos do alvorecer...
ESTE CANTO...
Jorge Bichuetti
Este canto... alumia os passos da caminhada
e os sonhos que me alimentam
nas esfregas da jornada;
não é, ele, uma sinfonia,
é só a passarada
com sua terna alegria....
Este canto... me acorda na magia de um novo dia..
MINHA FÉ
Jorge Bichuetti
Minha fé é flor, menino,
que brota toda fagueira;
não é trono nem é hino,
é um canto da mangueira...
Jorge Bichuetti
Hoje, o mundo ainda sombrio
me asfixia e me enlouquece,
num torpor de desalento e morte;
mas, nas entrelinhas das lágrimas,
antevejo o amanhã e, então,
já não choro descontente
as dores deste desencanto...
Caminho, apurando o passo,
como quem já enxerga
num fiapo de luar
os encantos do alvorecer...
ESTE CANTO...
Jorge Bichuetti
Este canto... alumia os passos da caminhada
e os sonhos que me alimentam
nas esfregas da jornada;
não é, ele, uma sinfonia,
é só a passarada
com sua terna alegria....
Este canto... me acorda na magia de um novo dia..
MINHA FÉ
Jorge Bichuetti
Minha fé é flor, menino,
que brota toda fagueira;
não é trono nem é hino,
é um canto da mangueira...
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
MESTRES DO CAMINHO: O NATAL DE DOM PEDRO CASALDÁLIGA
Natal...?
É difícil detectar O Anúncio
em meio a tantos anúncios que nos invadem.
Ainda existe Natal?
Natal é a Boa Nova?
Natal é também Páscoa?
Sabemos que «não há lugar para eles».
Sabemos que há lugar para todos,
até para Deus...
O boi e a mula,
fugindo do latifúndio,
se refugiaram nos olhos desta Criança.
A fome não é só um problema social,
é um crime mundial.
Contra o Agro-Negócio capitalista,
a Agro-Vida, o Bem Viver.
Tudo pode ser mentira,
menos a verdade de que Deus é Amor
e de que toda a Humanidade
é uma só família.
Deus continua entrando por debaixo,
pequeno, pobre, impotente,
mas trazendo-nos a sua Paz.
A dona Maria e o seu José
continuam na comunidade.
A Veva continua sendo tapirapé.
O sangue dos mártires
continua fecundando a primavera alternativa.
Os cajados dos pastores
(e do Parkinson também),
as bandeiras militantes,
as mãos solidárias
e os cantos da juventude
continuam alentando a Caminhada.
As estrelas só se enxergam de noite.
E de noite surge o Ressuscitado.
«Não tenhais medo».
Em coerência, com teimosia e na Esperança,
sejamos cada dia Natal,
cada dia sejamos Páscoa.
Amém, Axé, Awire, Aleluia.
Pedro Casaldáliga,
Natal 2010, ano novo 2011.
( Bispo Emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia)
É difícil detectar O Anúncio
em meio a tantos anúncios que nos invadem.
Ainda existe Natal?
Natal é a Boa Nova?
Natal é também Páscoa?
Sabemos que «não há lugar para eles».
Sabemos que há lugar para todos,
até para Deus...
O boi e a mula,
fugindo do latifúndio,
se refugiaram nos olhos desta Criança.
A fome não é só um problema social,
é um crime mundial.
Contra o Agro-Negócio capitalista,
a Agro-Vida, o Bem Viver.
Tudo pode ser mentira,
menos a verdade de que Deus é Amor
e de que toda a Humanidade
é uma só família.
Deus continua entrando por debaixo,
pequeno, pobre, impotente,
mas trazendo-nos a sua Paz.
A dona Maria e o seu José
continuam na comunidade.
A Veva continua sendo tapirapé.
O sangue dos mártires
continua fecundando a primavera alternativa.
Os cajados dos pastores
(e do Parkinson também),
as bandeiras militantes,
as mãos solidárias
e os cantos da juventude
continuam alentando a Caminhada.
As estrelas só se enxergam de noite.
E de noite surge o Ressuscitado.
«Não tenhais medo».
Em coerência, com teimosia e na Esperança,
sejamos cada dia Natal,
cada dia sejamos Páscoa.
Amém, Axé, Awire, Aleluia.
Pedro Casaldáliga,
Natal 2010, ano novo 2011.
( Bispo Emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia)
SOCIEDADE DE AMIGOS: A POESIA ENCANTA E NELA, SOMOS ENCANTADOS.
SAUDADE ... E MAIS ALÉM
Fernanda de Lima Almada
Ainda que movendo moinhos “desletrados”
valendo-me da fábrica do trabalho comum
confesso um eu triste.
Melancolia da solidão...
Abandonaram-me.
Foram embora as palavras e cadências...
o ritmo e a rima...
Nunca vesti a blusa amarela de Maiakovski...
E, sem dizer adeus,
vi partir aquela qualidade de “poeta operário”...
Não mais em mim encontro o atributo...
para a beleza e a suavidade da poesia...
A ausência...
Angústia da carência do verso.
Falta-me o verbo.
Excedem-me as lágrimas.
Não gosto de espadas e dragões...
Prefiro esperar pelo mais logo sentir num abraço
o perfume de suas asas de anjo-poeta.
Josiane Souza
Há ainda migalhas pelo chão.
O vento, sei, logo as levarão.
Me embrulho na manta da solidão,
Para que não me voe o que resta da paixão.
E inócua...fito os olhos no horizonte.
O que vejo?
Além do tépido anseio de possuir-lhe,
Que envenena meu sangue
Penetra com tupor em minh'alma
E esquizofreniza meus sentidos.
Será você...o Elfo que tanto procurei?
Teus longos fios de cabelos,
Ao se desmantelarem pelo zéfiro
Me cantam que sim!
Mas, amante, não posso me enganar.
A feiticeira da razão outroras prega-me estacas no coração.
Se assim, a lua beijar-lhe hoje,
Então, em todo bosque saberão.
Diante dela todos os lobos uivarão.
Que essa lágrinha que suavemente entorno
Minhas nódoas sangrentas limparão.
DIÁRIO DE BORDO: NO CAMINHO, ENCONTRAMOS...E NOS ENCONTRAMOS.
Jorge Bichuetti
Chove lá fora... e aqui, não faz frio, pois me aqueço no carinho e na ternura dos amigos...
A Lua anda peralta e me vendo, mais caseiro, já pensa, equivocadamente, que o mundo gira enluarado pelos encantos meigos das suas manhas e artimanhas...
O mundo é um território de estranhos e sedutores paradoxos.
Me encanta viver e explorar na vida a potência do novo.
Existe beleza e valor no real... Mas para mim a maior beleza e maior valor do real é a sua impermanência. É a possibilidade de se atualizar virtualidades que o transforma em um novo real, inusitado.
Gosto do existencialismo de Foucault na sua produção última quando assume o homem como projeto inacabado, uma multidão de tarefas...
Eu quero... " viver e não ter a vergonha de ser feliz"...
Eu quero... sofrer , superando as dores e feridas, na busca do encanto e do encantamento da alegria.
O homem e a vida é ... luta.
Luto, sonhando... e sonho, celebrando, a potência do novo que emerge das linhas de vida que nascem nas entranhas do devir.
Sonho, no entre... Assim , meus sonhos não são só meus.... São ressonâncias da vida e das multiplicidades maquínicas que me agenciam e metabolizam em mim alucinações do porvir.
Luto e caminho, e pego pensando, agora, que a vida e os encontros vivem na vitalidade, na simplicidade bruta e crua dos es, tanto quanto se esgota e agoniza na complexidade domesticada e bem vestida dos és.
Leio, e fico pensando que Deleuze me comtempla quando dizia que já não lhe servia a cultura de estoque, estante, estanque...
Quero pensar... para viver, com mais intensidade, entre um riso de menino, que ainda carrego, e meus pés e minha pele que sambam na sensualidade tresloucada da vida enluarada, devindo-se magia e poesia na potência dos bons encontros, onde minha velhice se remoça e eu canto..."todo dia, o sol levanta e a gente canta o sol de todo dia."
Chove lá fora... e aqui, não faz frio, pois me aqueço no carinho e na ternura dos amigos...
A Lua anda peralta e me vendo, mais caseiro, já pensa, equivocadamente, que o mundo gira enluarado pelos encantos meigos das suas manhas e artimanhas...
O mundo é um território de estranhos e sedutores paradoxos.
Me encanta viver e explorar na vida a potência do novo.
Existe beleza e valor no real... Mas para mim a maior beleza e maior valor do real é a sua impermanência. É a possibilidade de se atualizar virtualidades que o transforma em um novo real, inusitado.
Gosto do existencialismo de Foucault na sua produção última quando assume o homem como projeto inacabado, uma multidão de tarefas...
Eu quero... " viver e não ter a vergonha de ser feliz"...
Eu quero... sofrer , superando as dores e feridas, na busca do encanto e do encantamento da alegria.
O homem e a vida é ... luta.
Luto, sonhando... e sonho, celebrando, a potência do novo que emerge das linhas de vida que nascem nas entranhas do devir.
Sonho, no entre... Assim , meus sonhos não são só meus.... São ressonâncias da vida e das multiplicidades maquínicas que me agenciam e metabolizam em mim alucinações do porvir.
Luto e caminho, e pego pensando, agora, que a vida e os encontros vivem na vitalidade, na simplicidade bruta e crua dos es, tanto quanto se esgota e agoniza na complexidade domesticada e bem vestida dos és.
Leio, e fico pensando que Deleuze me comtempla quando dizia que já não lhe servia a cultura de estoque, estante, estanque...
Quero pensar... para viver, com mais intensidade, entre um riso de menino, que ainda carrego, e meus pés e minha pele que sambam na sensualidade tresloucada da vida enluarada, devindo-se magia e poesia na potência dos bons encontros, onde minha velhice se remoça e eu canto..."todo dia, o sol levanta e a gente canta o sol de todo dia."
domingo, 12 de dezembro de 2010
POR UMA NOVA TERRA, POR UM POVO POR-VIR
JORGE BICHUETTI
Muitos pensam a vida, de forma binária e daí um niilismo pinta de cinza o horizonte...
Toda miséria da vida, da ciência e da filosofia, para Deleuze, provinha do império dos és...
Assim, já começo este texto que cada reflexão parte de um paradigma, de uma visão de mundo e do mundo que vivenciamos no dia-a-dia.
Politicamente, sintonizo-me com Daniel Bensaid quando este afirma que um outro mundo é possível, mas mais do possível é necessário...
Não se trata de binarizar as opções entre o capitalismo e socialismo burocrático...
Para mim, trata-se de pensar que mundo queremos inventar e que valores éticos e estéticos nortearão nossa caminhada de reinvenção do mundo e de si mesmos.
Não é necessário rascunhar aqui as perversidades que nos impedem de aceitar a Terra como ela anda... A própria Terra clama e denuncia a inviabilidade da vida baseada na competição, na acumulação e na destrutividade.
Nem é necessário assinalar as misérias da subjetividade capitalística...
O homem não é... Ele devém e pode devir-se novo, diferente, uma singularidade terna e solidária...
O positivismo que via e lia a realidade pelo real quantificável, já consegue enfrentar as pesquisas que mostram a potência da virtualidade e criações inovadoras do caos.
A questão é si a mudança exige o protagonismo do homem que luta, sonha, se rebela e se insurge...
A própria caminhada de luta é um espaço de alisamento dos controles que nos subjetivam individualistas e competitivos, possessivos e movidos pela falta... E uma abertura para o disruptivo, o novo...
Uma Nova Terra, Um Povo Por-vir - é uma utopia ativa...
Então, perguntamos: o que pode um sonho?
Alguns dirão que o sonho é um ópio...
Outros o verão movimentam as forças da vida na construção da história e o sentirão como potência de re-encantamento do mundo e da vida.
Muitos poderão dizer que tudo isto é desrazão, loucura e delírio... Silencio-me, pois não tenho a menor admiração e nenhum orgulho pelo mundo criado pela normalidade, pela racionalidade técnico-instrumental, nem pelo pensamento da lógica formal.
Ousemos sonhar.. Lutemos pelos sonhos...
Este caminho... entre tantos me afeta e seduz pela sua capacidade de produção amorosa.
E pela força que emerge da vida que se sabe capaz de novos alvoreceres e novos voos na imensidão... Pela liberdade e pela vida, pela ternura e pela justiça , eu caminho... na sinfonia dos sonhos.
Muitos pensam a vida, de forma binária e daí um niilismo pinta de cinza o horizonte...
Toda miséria da vida, da ciência e da filosofia, para Deleuze, provinha do império dos és...
Assim, já começo este texto que cada reflexão parte de um paradigma, de uma visão de mundo e do mundo que vivenciamos no dia-a-dia.
Politicamente, sintonizo-me com Daniel Bensaid quando este afirma que um outro mundo é possível, mas mais do possível é necessário...
Não se trata de binarizar as opções entre o capitalismo e socialismo burocrático...
Para mim, trata-se de pensar que mundo queremos inventar e que valores éticos e estéticos nortearão nossa caminhada de reinvenção do mundo e de si mesmos.
Não é necessário rascunhar aqui as perversidades que nos impedem de aceitar a Terra como ela anda... A própria Terra clama e denuncia a inviabilidade da vida baseada na competição, na acumulação e na destrutividade.
Nem é necessário assinalar as misérias da subjetividade capitalística...
O homem não é... Ele devém e pode devir-se novo, diferente, uma singularidade terna e solidária...
O positivismo que via e lia a realidade pelo real quantificável, já consegue enfrentar as pesquisas que mostram a potência da virtualidade e criações inovadoras do caos.
A questão é si a mudança exige o protagonismo do homem que luta, sonha, se rebela e se insurge...
A própria caminhada de luta é um espaço de alisamento dos controles que nos subjetivam individualistas e competitivos, possessivos e movidos pela falta... E uma abertura para o disruptivo, o novo...
Uma Nova Terra, Um Povo Por-vir - é uma utopia ativa...
Então, perguntamos: o que pode um sonho?
Alguns dirão que o sonho é um ópio...
Outros o verão movimentam as forças da vida na construção da história e o sentirão como potência de re-encantamento do mundo e da vida.
Muitos poderão dizer que tudo isto é desrazão, loucura e delírio... Silencio-me, pois não tenho a menor admiração e nenhum orgulho pelo mundo criado pela normalidade, pela racionalidade técnico-instrumental, nem pelo pensamento da lógica formal.
Ousemos sonhar.. Lutemos pelos sonhos...
Este caminho... entre tantos me afeta e seduz pela sua capacidade de produção amorosa.
E pela força que emerge da vida que se sabe capaz de novos alvoreceres e novos voos na imensidão... Pela liberdade e pela vida, pela ternura e pela justiça , eu caminho... na sinfonia dos sonhos.
DIÁRIO DE BORDO: SOBRE A LIBERDADE E A SERVIDÃO
JORGE BICHUETTI
Café quente... O calor terno da minha pequena Lua tentando distrair-me e me levar... para o seu mundo de encantos e brincadeiras onde a seriedade é só uma trapaça para o a vida girar...
Ela, a Lua, é leve e suave.... Eu, Noel Rosa...
Ando, apaixonado por sambas...
Eles, mesmos os tristes e chorosos, me soam alegria e liberdade...
Pode a tristeza gerar alegria e ativar rupturas libertárias?
Vivemos um tempo de uma ditadura sutíl... A ditadura da felicidade, do sucesso, da beleza e do poder...
A vida parece compulsoriamente desafiada a correr nos trilhos da vitória.
Consumimos, escravizamos nosso tempo, ocupamos um lugar de respeito e realce, somos felizes...
Como é isso? Pode-se, verdadeiramente ser feliz, quando está não nasce da liberdade de ser e existir no compasso dos nosso desejos e sonhos, mas, sim, por decreto externo que nos sevicia e nos robotiza, fazendo-nos viver alheios a si mesmo e presos ao instituído nas normas dominantes do exirtir sedentário, individualista e exibicionista do nosso mundo de espetáculos.
Liberdade, liberdade... abre as asas sobre nós...
Que liberdade é a liberdade que ousamos desejar?
Votamos, podemos nos organizar em grupos e até nos manifestar politicamente...
Vamos e voltamos, e não conhecemos fronteiras...
O sexo não é mais proíbido, e se pensa que cada faz o que determina para si próprio...
O poder opressivo há muito deixou de se impor através do uso do não, abusa-se do sim e por meio do sim se priva do homem da liberdade genuina...
Podemos viver diferente, o sistema não nos dira não, nos privará do sim e nos colocará à margem e iludidos com a falsa liberdade vigente nos acreditaremos livres, não oprimidos nem reprimidos, porém fracassados.
E é isto que os teóricos da sociedade mundial de controle nomearam inclusão diferencial...
Para sermos fracassados, calamos o próprio corpo e a própria alma, e vivemos...
Vivemos sem direito ao ócio e à preguiça...
Vivemos com o tempo todo ocupado e sem tempo para brincar, amar, passear e sambar... Sem tempo para perguntar: qual o sentido de tudo isso que me deixa sem tempo?
Vivemos como servos, servos luxuosos e vitoriosos...
Demorei muito a entender que a natureza não me entendia....
A pequena Lua tem sido minha professora... Paciente e persistente, me revela... que não vi o cacho novo de flores brancas e cheirosas que fascina a vida quintal da minha casa... que não percebi nem senti a brisa no baialado do álamos que cantam silenciosos a dádiva refrescante do vento... que não vi as cores novas do pôr-do-sol em notei o brilho encantado das estrelas...
E descobrindo, que liberdade é vida intensa na alegria e tristeza, mas vida potente nos desejos e sonhos... Eu canto, "om que roupa eu vou, pro samba que você me convidou"...
Café quente... O calor terno da minha pequena Lua tentando distrair-me e me levar... para o seu mundo de encantos e brincadeiras onde a seriedade é só uma trapaça para o a vida girar...
Ela, a Lua, é leve e suave.... Eu, Noel Rosa...
Ando, apaixonado por sambas...
Eles, mesmos os tristes e chorosos, me soam alegria e liberdade...
Pode a tristeza gerar alegria e ativar rupturas libertárias?
Vivemos um tempo de uma ditadura sutíl... A ditadura da felicidade, do sucesso, da beleza e do poder...
A vida parece compulsoriamente desafiada a correr nos trilhos da vitória.
Consumimos, escravizamos nosso tempo, ocupamos um lugar de respeito e realce, somos felizes...
Como é isso? Pode-se, verdadeiramente ser feliz, quando está não nasce da liberdade de ser e existir no compasso dos nosso desejos e sonhos, mas, sim, por decreto externo que nos sevicia e nos robotiza, fazendo-nos viver alheios a si mesmo e presos ao instituído nas normas dominantes do exirtir sedentário, individualista e exibicionista do nosso mundo de espetáculos.
Liberdade, liberdade... abre as asas sobre nós...
Que liberdade é a liberdade que ousamos desejar?
Votamos, podemos nos organizar em grupos e até nos manifestar politicamente...
Vamos e voltamos, e não conhecemos fronteiras...
O sexo não é mais proíbido, e se pensa que cada faz o que determina para si próprio...
O poder opressivo há muito deixou de se impor através do uso do não, abusa-se do sim e por meio do sim se priva do homem da liberdade genuina...
Podemos viver diferente, o sistema não nos dira não, nos privará do sim e nos colocará à margem e iludidos com a falsa liberdade vigente nos acreditaremos livres, não oprimidos nem reprimidos, porém fracassados.
E é isto que os teóricos da sociedade mundial de controle nomearam inclusão diferencial...
Para sermos fracassados, calamos o próprio corpo e a própria alma, e vivemos...
Vivemos sem direito ao ócio e à preguiça...
Vivemos com o tempo todo ocupado e sem tempo para brincar, amar, passear e sambar... Sem tempo para perguntar: qual o sentido de tudo isso que me deixa sem tempo?
Vivemos como servos, servos luxuosos e vitoriosos...
Demorei muito a entender que a natureza não me entendia....
A pequena Lua tem sido minha professora... Paciente e persistente, me revela... que não vi o cacho novo de flores brancas e cheirosas que fascina a vida quintal da minha casa... que não percebi nem senti a brisa no baialado do álamos que cantam silenciosos a dádiva refrescante do vento... que não vi as cores novas do pôr-do-sol em notei o brilho encantado das estrelas...
E descobrindo, que liberdade é vida intensa na alegria e tristeza, mas vida potente nos desejos e sonhos... Eu canto, "om que roupa eu vou, pro samba que você me convidou"...
sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
BONS ENCONTROS: NALU FARIA E A LUTA DAS MULHERES
19/11/2010
Psicóloga, coordenadora geral da Sempreviva Organização Feminista (SOF) e integrante da Secretaria Nacional da Marcha Mundial das Mulheres, Nalu Faria é um dos nomes mais importantes do Brasil na questão da luta das mulheres. Feminista e anticapitalista, ela discute, nesta entrevista à Caros Amigos, as principais bandeiras do movimento de mulheres no país, como violência doméstica, equiparação salarial, luta contra o machismo e o direito ao aborto. A falta de atendimento médico e hospitalar adequado tem sido responsável pela morte de mais de 500 mulheres por ano no Brasil, devido a abortos clandestinos. .São mortes que poderiam ser evitadas. O assunto é recolocado na perspectiva da luta histórica da sociedade, diferentemente das distorções que sofreu no último processo eleitoral. Vale a pena conferir o que Nalu Faria tem a nos contar.
Tatiana Merlino - Gostaria que você falasse um pouco da sua infância, até o início da sua trajetória no feminismo.
Hamilton Octavio de Souza - E nome completo.
Nalu Faria – Bom, meu nome é Nalu Faria Silva, eu nasci em Uberaba. Minha mãe morava na roça, e fui para Uberaba só para nascer e voltei. Eu vivi até os 9 anos em um sítio e depois a gente mudou para uma cidadezinha do lado, Água Comprida, onde vivi até terminar, na época, o ginásio.
Tatiana Merlino – Em que ano você nasceu?
Eu nasci em 1958 e vivi lá em Água Comprida até 1974. Aí fui para Uberaba, fiz o colegial, fiz a universidade lá, comecei a militar quando entrei na universidade, em 1978.
Lúcia Rodrigues – Que curso?
Fiz Psicologia. E vim para São Paulo. Tem exatamente 27 anos. Cheguei em São Paulo no dia 21 de outubro de 1983.
Tatiana Merlino - Por que você veio para São Paulo?
Acho que por duas coisas. Uma, porque estava militando em Uberaba. Era militante feminista no movimento estudantil lá. Estava num grupo de mulheres, no Partido dos Trabalhadores, as chamadas fundadoras do PT na cidade. E eu tinha muita vontade de militar. Então, eu achava que Uberaba era pequena. Queria militar e São Paulo aparecia como um bom lugar. Então, isso foi um dos motivos. Militante do PT e formada em Psicologia é difícil o acesso real ao emprego. Então vim para cá.
Tatiana Merlino – Em Uberaba você já começou a militar no movimento de mulheres?
Em Uberaba, a gente comemorou o 8 de março de 1980. Foi o primeiro contato com esse debate. Eu era do curso da Psicologia e lá tínhamos um bom grupo que naquela época estava aberto a esses temas da sexualidade, da discussão das mulheres, éramos briguentas. Nós escutávamos muito: “Pra quê vocês estão estudando se vão casar e ter filhos, pôr o diploma na gaveta, tudo isso”. Então, tinha muitos ataques machistas. O primeiro debate que eu fiz foi sobre aborto, um pouco antes de vir para São Paulo, 1983. Chegando em São Paulo, eu até brincava que tinha muita vontade de militar, mas com o desemprego em 1983, eu costumo dizer que a militância foi a última coisa que eu resolvi. Aqui, fiz várias tentativas de militância até que consegui achar um lugar no movimento de mulheres e, em 1985, eu comecei a militar no movimento de mulheres. E militando de forma cotidiana no PT nos últimos anos, em particular na secretaria de mulheres do PT. Eu fui da secretaria de mulheres do PT até 2004.
Hamilton Octavio de Souza – Antes disso, no final de 1979, a gente tinha aqui em São Paulo alguns jornais do movimento feminista: Nós, Mulheres, Mulherio, Brasil Mulher. Tinha vários grupos feministas. Quando você começou a militar, como era o movimento das mulheres em 1985?
Eu cheguei em um momento bem difícil do movimento de mulheres. Quando eu cheguei, não tinha um espaço de articulação do movimento, porque tinha tido aquilo no período da campanha eleitoral de 1982. A visão dos projetos políticos frente à transição da ditadura marcou dois campos no movimento das mulheres. O setor que era, na época, mais vinculado ao PMDB foi entrando mais para a política institucional, conselhos, e o outro campo de autonomistas, de reflexão, do Nós Mulheres, e outros, se desarticulou. A gente se juntava para organizar o 8 de março, e, justamente nessa época, a gente estava discutindo a importância de ter uma coordenação do movimento de São Paulo para que funcionássemos para além do 8 de março. Mas, a partir de 1986, principalmente, o Encontro Feminista Latino-americano, que teve aqui em São Paulo, em 1985, deu um novo gás, e a partir de 1986 começaram a acontecer várias coisas no movimento de mulheres, para mim, que queria militar com os setores populares, que foi a articulação das mulheres da CUT, que foi em 1986. A gente começa a ir articulando outras coisas nos setores mistos.
Hamilton Octavio de Souza – Quais eram os pontos de luta?
Naquela época, tinha uma agenda forte com relação ao tema que se chamava planejamento familiar. Também tinha os temas da violência e da creche. A gente tinha vindo da campanha por creche, já tinha isso. E um tema genérico de “salário igual para trabalho igual”. Aí, com a Constituinte aparece o tema do aborto. A gente fez um processo de mobilização para colher 30 mil assinaturas, para entrar com uma emenda na Constituinte. Foi o momento que a gente colocou mais a cara na rua, com o tema do aborto. Conseguimos as 30 mil assinaturas e o que nós conseguimos na Constituinte, que o direito à vida, na Constituição, é desde o nascimento.
Hamilton Octavio de Souza - A diferença era entre a concepção e o nascimento?
No movimento das mulheres tinha prevalecido essa visão de não colocar o tema do aborto, porque se pusesse, ia apanhar. Como no anteprojeto vem essa questão do direito à vida desde a concepção, exige-se uma reação do movimento e aí aparece a emenda, a negociação, a mudança do artigo sobre o direito à vida. Depois começa a haver uma articulação das mulheres negras, com um primeiro encontro em 1988. Reaparece o grupo de mulheres lésbicas. A gente teve um Encontro Feminista em 1989, aqui em São Paulo, o 10º Encontro Nacional Feminista. Foi um marco: primeiro a gente saiu de lá com a ideia de fazer uma campanha nacional pela legalização do aborto, que era uma polêmica. Teve debates, oficinas amplas sobre a questão lésbica, do partido. Tinha coisas que também que, por um motivo ou por outro, no movimento feminista eram meio tabu, o partido não entrava, porque era movimento autônomo. Aí, depois nos anos 1990, o movimento de mulheres cai num processo de institucionalização, que a gente chama de aumento das Ongs, um momento que o movimento acompanha muito as agendas da ONU, que é essa idéia do neoliberalismo, débâcle mesmo na discussão no movimento mais de esquerda.
Hamilton Octavio de Souza - Por que afetou? Em que aspecto?
Porque começa com um discurso no movimento de mulheres do impacto da globalização, do neoliberalismo. Primeiro uma ideia de que tinha perdido o papel dos Estados nacionais, que era uma agenda global da ONU e deveria inserir as questões dos direitos ali. Então, isso foi uma coisa que prevaleceu na América Latina e que significou uma profissionalização do movimento das mulheres, as pessoas começam a participar das conferências da ONU. Nossa avaliação, da Sempre Viva Organização Feminista (SOF), setor em que milito na Marcha Mundial das Mulheres (MMM) é que, embora não tenha grandes vitórias para o movimento de mulheres, na segunda metade dos anos 1990, as feministas que investiram nesse processo manejaram com um discurso triunfalista, de dizer que estava alcançando as vitórias; por exemplo, na Conferência do Cairo, que foi a conferência sobre população, entrou o tema do aborto, pela primeira vez, em 1994. Só no final dos anos 1990 que a gente consegue recuperar o fôlego, organizando um setor mais crítico ao neoliberalismo. Aqui no Brasil, nós identificamos como duas coisas: primeira, a vinda da campanha da Marcha Mundial das Mulheres para cá...
Tatiana Merlino - Como a campanha da Marcha chegou?
As mulheres do Quebec começaram a articular a Marcha. Elas tinham feito lá, em 1995, Pão e Rosas, já depois da assinatura do NAFTA, percebendo que ele ia trazer muitos retrocessos para as mulheres. E elas fizeram uma campanha, uma marcha mesmo, de 200 quilômetros e as principais reivindicações tinham a ver com o aumento do salário mínimo, coisas com relação à migração, a economia solidária, os direitos e documentação das imigrantes. E lá surgiu a idéia de ter uma marcha internacional em 2000. Aí elas começaram a articular e criaram essa coisa da internet para a gente aderir. E quem chamou a primeira reunião aqui para definir quem ia para o encontro internacional em 1998, onde a gente definiria a plataforma da marcha, foi a própria CUT, o setor de mulheres. Ela começou como uma campanha, em 2000, contra a pobreza e a violência. Fizemos a marcha em 2000, e teve grande impacto, já desde o seu lançamento, porque era algo articulado, uma campanha nacional que era também internacional. E, na avaliação da marcha, que foi lá em Nova York, depois de 17 de outubro, teve a proposta de continuidade, como um movimento permanente. Foram 163 países que participaram da primeira [marcha]. Hoje nós estamos em 70 países. Então, começamos a articular a marcha como um movimento permanente. A gente se vinculou muito ao processo do Fórum Social Mundial. Fizemos duas ações que ajudaram muito a articular a marcha aqui: o nosso envolvimento na campanha contra a Alca, e a campanha pela valorização do salário mínimo. Outra coisa que foi forte desde o início na marcha foi conseguir articular um movimento que junta mulheres da cidade e do campo.
Hamilton Octavio de Souza - Quais são os pontos de união entre as mulheres do campo e as mulheres da cidade? O que tem em comum de luta?
A gente está vendo mais pontos que unificam. No caso das trabalhadoras rurais, no início do ano 2000, depois de ter conquistado o direito à aposentadoria, o reconhecimento como trabalhadora rural, elas estavam cada vez mais reivindicando políticas em relação, vamos dizer assim genericamente, ao mundo do trabalho. Não só a posse da terra, crédito, e outras coisas que diferencia de movimento para movimento, mas tem uma pauta comum, aí. Mas, é impressionante como, por exemplo, para a trabalhadora rural também toca o tema da violência, o tema da saúde. E, na medida em que a gente está construindo um movimento que olha para esse geral do modelo de desenvolvimento, do modelo de sociedade, os pontos em comum são cada vez maiores. Então, ter uma opinião sobre a política econômica, ter uma opinião sobre a política previdenciária são coisas que nos juntam. A gente tem tentado mostrar que não se constrói soberania alimentar se não, por exemplo, se altera o que é a indústria da alimentação. Os temas que antes não pareciam ter tanto vínculo entre a mulher urbana e a rural, a gente vai mostrando como as coisas estão vinculadas.
Lúcia Rodrigues - Hoje, dá para se dizer que existe uma bandeira das mulheres?
Este é um dos problemas que nós temos no movimento de mulheres. Sempre foi difícil priorizar. O movimento de mulheres, depois foi se organizando muito por temas. Então, tinha a turma que trabalhava o tema da violência, turma da saúde, depois da moradia, sindical. Então, o leque foi se abrindo muito. E isso é uma das dificuldades que a gente tem de construir processos de articulação e mobilização mais ampla, porque tem uma plataforma muito ampla que não consegue definir prioridades por um período. Então, é um movimento multifacetado. Na verdade, nós não somos o movimento de mulheres, somos um setor do movimento de mulheres, no nosso caso da Marcha.
Entrevista Nalu Faria:
“O aborto mal feito é a terceira causa de morte materna”
Participaram: Cecília Luedemann, Gabriela Moncau, Hamilton Octavio de Souza, Lúcia Rodrigues, Otávio Nagoya e Tatiana Merlino. Fotos: Jesus Carlos
“O aborto mal feito é a terceira causa de morte materna”
Participaram: Cecília Luedemann, Gabriela Moncau, Hamilton Octavio de Souza, Lúcia Rodrigues, Otávio Nagoya e Tatiana Merlino. Fotos: Jesus Carlos
Psicóloga, coordenadora geral da Sempreviva Organização Feminista (SOF) e integrante da Secretaria Nacional da Marcha Mundial das Mulheres, Nalu Faria é um dos nomes mais importantes do Brasil na questão da luta das mulheres. Feminista e anticapitalista, ela discute, nesta entrevista à Caros Amigos, as principais bandeiras do movimento de mulheres no país, como violência doméstica, equiparação salarial, luta contra o machismo e o direito ao aborto. A falta de atendimento médico e hospitalar adequado tem sido responsável pela morte de mais de 500 mulheres por ano no Brasil, devido a abortos clandestinos. .São mortes que poderiam ser evitadas. O assunto é recolocado na perspectiva da luta histórica da sociedade, diferentemente das distorções que sofreu no último processo eleitoral. Vale a pena conferir o que Nalu Faria tem a nos contar.
Tatiana Merlino - Gostaria que você falasse um pouco da sua infância, até o início da sua trajetória no feminismo.
Hamilton Octavio de Souza - E nome completo.
Nalu Faria – Bom, meu nome é Nalu Faria Silva, eu nasci em Uberaba. Minha mãe morava na roça, e fui para Uberaba só para nascer e voltei. Eu vivi até os 9 anos em um sítio e depois a gente mudou para uma cidadezinha do lado, Água Comprida, onde vivi até terminar, na época, o ginásio.
Tatiana Merlino – Em que ano você nasceu?
Eu nasci em 1958 e vivi lá em Água Comprida até 1974. Aí fui para Uberaba, fiz o colegial, fiz a universidade lá, comecei a militar quando entrei na universidade, em 1978.
Lúcia Rodrigues – Que curso?
Fiz Psicologia. E vim para São Paulo. Tem exatamente 27 anos. Cheguei em São Paulo no dia 21 de outubro de 1983.
Tatiana Merlino - Por que você veio para São Paulo?
Acho que por duas coisas. Uma, porque estava militando em Uberaba. Era militante feminista no movimento estudantil lá. Estava num grupo de mulheres, no Partido dos Trabalhadores, as chamadas fundadoras do PT na cidade. E eu tinha muita vontade de militar. Então, eu achava que Uberaba era pequena. Queria militar e São Paulo aparecia como um bom lugar. Então, isso foi um dos motivos. Militante do PT e formada em Psicologia é difícil o acesso real ao emprego. Então vim para cá.
Tatiana Merlino – Em Uberaba você já começou a militar no movimento de mulheres?
Em Uberaba, a gente comemorou o 8 de março de 1980. Foi o primeiro contato com esse debate. Eu era do curso da Psicologia e lá tínhamos um bom grupo que naquela época estava aberto a esses temas da sexualidade, da discussão das mulheres, éramos briguentas. Nós escutávamos muito: “Pra quê vocês estão estudando se vão casar e ter filhos, pôr o diploma na gaveta, tudo isso”. Então, tinha muitos ataques machistas. O primeiro debate que eu fiz foi sobre aborto, um pouco antes de vir para São Paulo, 1983. Chegando em São Paulo, eu até brincava que tinha muita vontade de militar, mas com o desemprego em 1983, eu costumo dizer que a militância foi a última coisa que eu resolvi. Aqui, fiz várias tentativas de militância até que consegui achar um lugar no movimento de mulheres e, em 1985, eu comecei a militar no movimento de mulheres. E militando de forma cotidiana no PT nos últimos anos, em particular na secretaria de mulheres do PT. Eu fui da secretaria de mulheres do PT até 2004.
Hamilton Octavio de Souza – Antes disso, no final de 1979, a gente tinha aqui em São Paulo alguns jornais do movimento feminista: Nós, Mulheres, Mulherio, Brasil Mulher. Tinha vários grupos feministas. Quando você começou a militar, como era o movimento das mulheres em 1985?
Eu cheguei em um momento bem difícil do movimento de mulheres. Quando eu cheguei, não tinha um espaço de articulação do movimento, porque tinha tido aquilo no período da campanha eleitoral de 1982. A visão dos projetos políticos frente à transição da ditadura marcou dois campos no movimento das mulheres. O setor que era, na época, mais vinculado ao PMDB foi entrando mais para a política institucional, conselhos, e o outro campo de autonomistas, de reflexão, do Nós Mulheres, e outros, se desarticulou. A gente se juntava para organizar o 8 de março, e, justamente nessa época, a gente estava discutindo a importância de ter uma coordenação do movimento de São Paulo para que funcionássemos para além do 8 de março. Mas, a partir de 1986, principalmente, o Encontro Feminista Latino-americano, que teve aqui em São Paulo, em 1985, deu um novo gás, e a partir de 1986 começaram a acontecer várias coisas no movimento de mulheres, para mim, que queria militar com os setores populares, que foi a articulação das mulheres da CUT, que foi em 1986. A gente começa a ir articulando outras coisas nos setores mistos.
Hamilton Octavio de Souza – Quais eram os pontos de luta?
Naquela época, tinha uma agenda forte com relação ao tema que se chamava planejamento familiar. Também tinha os temas da violência e da creche. A gente tinha vindo da campanha por creche, já tinha isso. E um tema genérico de “salário igual para trabalho igual”. Aí, com a Constituinte aparece o tema do aborto. A gente fez um processo de mobilização para colher 30 mil assinaturas, para entrar com uma emenda na Constituinte. Foi o momento que a gente colocou mais a cara na rua, com o tema do aborto. Conseguimos as 30 mil assinaturas e o que nós conseguimos na Constituinte, que o direito à vida, na Constituição, é desde o nascimento.
Hamilton Octavio de Souza - A diferença era entre a concepção e o nascimento?
No movimento das mulheres tinha prevalecido essa visão de não colocar o tema do aborto, porque se pusesse, ia apanhar. Como no anteprojeto vem essa questão do direito à vida desde a concepção, exige-se uma reação do movimento e aí aparece a emenda, a negociação, a mudança do artigo sobre o direito à vida. Depois começa a haver uma articulação das mulheres negras, com um primeiro encontro em 1988. Reaparece o grupo de mulheres lésbicas. A gente teve um Encontro Feminista em 1989, aqui em São Paulo, o 10º Encontro Nacional Feminista. Foi um marco: primeiro a gente saiu de lá com a ideia de fazer uma campanha nacional pela legalização do aborto, que era uma polêmica. Teve debates, oficinas amplas sobre a questão lésbica, do partido. Tinha coisas que também que, por um motivo ou por outro, no movimento feminista eram meio tabu, o partido não entrava, porque era movimento autônomo. Aí, depois nos anos 1990, o movimento de mulheres cai num processo de institucionalização, que a gente chama de aumento das Ongs, um momento que o movimento acompanha muito as agendas da ONU, que é essa idéia do neoliberalismo, débâcle mesmo na discussão no movimento mais de esquerda.
Hamilton Octavio de Souza - Por que afetou? Em que aspecto?
Porque começa com um discurso no movimento de mulheres do impacto da globalização, do neoliberalismo. Primeiro uma ideia de que tinha perdido o papel dos Estados nacionais, que era uma agenda global da ONU e deveria inserir as questões dos direitos ali. Então, isso foi uma coisa que prevaleceu na América Latina e que significou uma profissionalização do movimento das mulheres, as pessoas começam a participar das conferências da ONU. Nossa avaliação, da Sempre Viva Organização Feminista (SOF), setor em que milito na Marcha Mundial das Mulheres (MMM) é que, embora não tenha grandes vitórias para o movimento de mulheres, na segunda metade dos anos 1990, as feministas que investiram nesse processo manejaram com um discurso triunfalista, de dizer que estava alcançando as vitórias; por exemplo, na Conferência do Cairo, que foi a conferência sobre população, entrou o tema do aborto, pela primeira vez, em 1994. Só no final dos anos 1990 que a gente consegue recuperar o fôlego, organizando um setor mais crítico ao neoliberalismo. Aqui no Brasil, nós identificamos como duas coisas: primeira, a vinda da campanha da Marcha Mundial das Mulheres para cá...
Tatiana Merlino - Como a campanha da Marcha chegou?
As mulheres do Quebec começaram a articular a Marcha. Elas tinham feito lá, em 1995, Pão e Rosas, já depois da assinatura do NAFTA, percebendo que ele ia trazer muitos retrocessos para as mulheres. E elas fizeram uma campanha, uma marcha mesmo, de 200 quilômetros e as principais reivindicações tinham a ver com o aumento do salário mínimo, coisas com relação à migração, a economia solidária, os direitos e documentação das imigrantes. E lá surgiu a idéia de ter uma marcha internacional em 2000. Aí elas começaram a articular e criaram essa coisa da internet para a gente aderir. E quem chamou a primeira reunião aqui para definir quem ia para o encontro internacional em 1998, onde a gente definiria a plataforma da marcha, foi a própria CUT, o setor de mulheres. Ela começou como uma campanha, em 2000, contra a pobreza e a violência. Fizemos a marcha em 2000, e teve grande impacto, já desde o seu lançamento, porque era algo articulado, uma campanha nacional que era também internacional. E, na avaliação da marcha, que foi lá em Nova York, depois de 17 de outubro, teve a proposta de continuidade, como um movimento permanente. Foram 163 países que participaram da primeira [marcha]. Hoje nós estamos em 70 países. Então, começamos a articular a marcha como um movimento permanente. A gente se vinculou muito ao processo do Fórum Social Mundial. Fizemos duas ações que ajudaram muito a articular a marcha aqui: o nosso envolvimento na campanha contra a Alca, e a campanha pela valorização do salário mínimo. Outra coisa que foi forte desde o início na marcha foi conseguir articular um movimento que junta mulheres da cidade e do campo.
Hamilton Octavio de Souza - Quais são os pontos de união entre as mulheres do campo e as mulheres da cidade? O que tem em comum de luta?
A gente está vendo mais pontos que unificam. No caso das trabalhadoras rurais, no início do ano 2000, depois de ter conquistado o direito à aposentadoria, o reconhecimento como trabalhadora rural, elas estavam cada vez mais reivindicando políticas em relação, vamos dizer assim genericamente, ao mundo do trabalho. Não só a posse da terra, crédito, e outras coisas que diferencia de movimento para movimento, mas tem uma pauta comum, aí. Mas, é impressionante como, por exemplo, para a trabalhadora rural também toca o tema da violência, o tema da saúde. E, na medida em que a gente está construindo um movimento que olha para esse geral do modelo de desenvolvimento, do modelo de sociedade, os pontos em comum são cada vez maiores. Então, ter uma opinião sobre a política econômica, ter uma opinião sobre a política previdenciária são coisas que nos juntam. A gente tem tentado mostrar que não se constrói soberania alimentar se não, por exemplo, se altera o que é a indústria da alimentação. Os temas que antes não pareciam ter tanto vínculo entre a mulher urbana e a rural, a gente vai mostrando como as coisas estão vinculadas.
Lúcia Rodrigues - Hoje, dá para se dizer que existe uma bandeira das mulheres?
Este é um dos problemas que nós temos no movimento de mulheres. Sempre foi difícil priorizar. O movimento de mulheres, depois foi se organizando muito por temas. Então, tinha a turma que trabalhava o tema da violência, turma da saúde, depois da moradia, sindical. Então, o leque foi se abrindo muito. E isso é uma das dificuldades que a gente tem de construir processos de articulação e mobilização mais ampla, porque tem uma plataforma muito ampla que não consegue definir prioridades por um período. Então, é um movimento multifacetado. Na verdade, nós não somos o movimento de mulheres, somos um setor do movimento de mulheres, no nosso caso da Marcha.
Para ler a entrevista completa e outras matérias confira a edição de novembro da revista Caros Amigos
SOCIEDADE DE AMIGOS: PAULO CECÍLIO
Tietê
Paulo Cecílio
De cada estação
na carne recebe
peixe de plástico/plutônio
saco de vômito/ferida
carta de suicídio/assombração
arranha-se em prego enferrujado.
range denso/ cansado/podre.
Mas tietê é um rio:
na última estação,
abraça o mar...
Apêgo
Paulo Cecílio
Não quero devolver
os materiais que me sustentam.
Temo matar a morte:
se deus morre comigo,
quem herdará
minha ternura?
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
DIÁRIO DE BORDO: CONFISSÕES PROÍBIDAS DE UM ESQUIZOANALISTA
JORGE BICHUETTI
A vida canta... os pássaros piam, degustando o alpiste jogado no chão... e o céu nunca está alheio a sua missão de nos penetrar, desterritorilizando os espaços e nos dando acesso ao território chamado imensidão.
Minha vida é a vida de um homem comum, e meu caminho é o perambular de quem à procura dos sonhos denuncia ou anuncia que esta vida necessita ser, urgentemente, transformada.
Me encanta as paixões alegres... Ainda mesmo quando vejo minhas lágrimas secando no varal.. as paixões tristes devem nos motivar a seguir , procurando um bom encontro e nele, a mágica e a poesia da alegria.
Um corpo tudo pode... As dores do tempo e tanto tempo de dores me levaram a crer que o corpo que tudo pode, pode se coletiviza-se , se solidariza-se, se desindividualizando-se, vislumbra-se corpo social...
Me quero livre, creio na liberdade, porém, descubro no caminho que entre a palavra e e o ato, há um uma tempestade, um abismo, um perigo que ronda e assombra; sendo necessário sempre guerrear...
O desejo vibra, constrói e inventa... Ele é sempre a novidade que surge no horizonte, colorindo-se sem que tenhamos os domínios das cores e dos desenhos... E me adoeço sempre que me esqueço do horizonte e me prendo nos percalços da estrada. Aí, onde penso que desejo, só respiro o fel envenenado das repetições traiçoeiras que nos fazem viscosos e pantanosos , quando a vida florescente nos oferece asas e brisa para ir um pouco além...
Reclamo, rogo, mendigo... Louca louvação... Não somos a falta, a falta se foi e se esfumaçou ma poeira do nada, somos a potência do novo e perdemos tempo e energia restaurando múmias que podem ser tingidas, mas nunca ressuscitarão... O novo nos chama, é chama viva e incandescente... cheia de calor e ternura, e nós querendo a vida, rondando os abutres que se alimentam dos restos de um cemitério.
Sou tantos ... e nego-me, aprisionando-me nos limites de um dos que sou, mas que já tem vigor e brilho para me levar aos encantos que vida produz, incessantemente, e se não desfrutamos é porque fechamos a boca no escroto da vida que recusamos vomitar...
Meu canto anda mudo, meus passos lentificados: não é vida que me falta, sou eu longe da vida, querendo a morte revivida numa paródia ridícula, onde a tristeza impera, no canto lúgubre de quem não vê o baile da vida, valsando alegrias e novas possibidades de caminhos e de vidas reinstaurando-se no invenção de um novo dia.
Quero o novo... A vida e o belo... Que nascem do homem que já se não faz prisioneiro do poder ilusório de suas
velhas opiniões... De suas dependências... De sua escravidão...
A vida canta... os pássaros piam, degustando o alpiste jogado no chão... e o céu nunca está alheio a sua missão de nos penetrar, desterritorilizando os espaços e nos dando acesso ao território chamado imensidão.
Minha vida é a vida de um homem comum, e meu caminho é o perambular de quem à procura dos sonhos denuncia ou anuncia que esta vida necessita ser, urgentemente, transformada.
Me encanta as paixões alegres... Ainda mesmo quando vejo minhas lágrimas secando no varal.. as paixões tristes devem nos motivar a seguir , procurando um bom encontro e nele, a mágica e a poesia da alegria.
Um corpo tudo pode... As dores do tempo e tanto tempo de dores me levaram a crer que o corpo que tudo pode, pode se coletiviza-se , se solidariza-se, se desindividualizando-se, vislumbra-se corpo social...
Me quero livre, creio na liberdade, porém, descubro no caminho que entre a palavra e e o ato, há um uma tempestade, um abismo, um perigo que ronda e assombra; sendo necessário sempre guerrear...
O desejo vibra, constrói e inventa... Ele é sempre a novidade que surge no horizonte, colorindo-se sem que tenhamos os domínios das cores e dos desenhos... E me adoeço sempre que me esqueço do horizonte e me prendo nos percalços da estrada. Aí, onde penso que desejo, só respiro o fel envenenado das repetições traiçoeiras que nos fazem viscosos e pantanosos , quando a vida florescente nos oferece asas e brisa para ir um pouco além...
Reclamo, rogo, mendigo... Louca louvação... Não somos a falta, a falta se foi e se esfumaçou ma poeira do nada, somos a potência do novo e perdemos tempo e energia restaurando múmias que podem ser tingidas, mas nunca ressuscitarão... O novo nos chama, é chama viva e incandescente... cheia de calor e ternura, e nós querendo a vida, rondando os abutres que se alimentam dos restos de um cemitério.
Sou tantos ... e nego-me, aprisionando-me nos limites de um dos que sou, mas que já tem vigor e brilho para me levar aos encantos que vida produz, incessantemente, e se não desfrutamos é porque fechamos a boca no escroto da vida que recusamos vomitar...
Meu canto anda mudo, meus passos lentificados: não é vida que me falta, sou eu longe da vida, querendo a morte revivida numa paródia ridícula, onde a tristeza impera, no canto lúgubre de quem não vê o baile da vida, valsando alegrias e novas possibidades de caminhos e de vidas reinstaurando-se no invenção de um novo dia.
Quero o novo... A vida e o belo... Que nascem do homem que já se não faz prisioneiro do poder ilusório de suas
velhas opiniões... De suas dependências... De sua escravidão...
POESIAS: SONHOS, MIRAGENS E DELÍRIOS
UM DIA
Jorge Bichuetti
Carrego meus sonhos e os tenho;
às vezes,, são asas e me dão o céu,
doutras, se fazem cruzes e seus pesos
me ferem de angústia e aflição...
A vida é um louco engenho
que cada dia se mostra diferente,
a semente floresce e perfuma,
ja as cinzas da morte gera dissolução.
Um dia, poderei ver a vida
sem as nuvens escuras da ilusão
e sem as vertigens do medo,
este medo que domina e assombra
as noites de desnsa escuridão.
Um dia, voltarei a ser criança
e os sonhos conspirarão
no caminho do amanhã,
Então, esverdeado de esperança
viverei cada dia,intensamente,
na certeza de que novos dias nascerão.
DELÍRIO
Jorge Bichuetti
Estive na lua,
de lá, me vi:
um homem
andando,
um pássaro
voando,
e um verme
orando....
Meus passos
seguiam
o caminho das flores...
Meu vôo
roubava
as cores do arco-íris...
Minha prece
celebrava
a fertilidade da vida...
Meu delírio,
lucidamente,
desnudava o explendor
da Terra, minha casa,
nunca vista,
e beleza da vida,
quase sempre nunca vivida.
Acordei e compreendi
que o desespero e a angústia
eram minhas alucinações,
e o mundo me esperava
para se florir e se fecundar
com os germes das minhas ilusões.
Jorge Bichuetti
Carrego meus sonhos e os tenho;
às vezes,, são asas e me dão o céu,
doutras, se fazem cruzes e seus pesos
me ferem de angústia e aflição...
A vida é um louco engenho
que cada dia se mostra diferente,
a semente floresce e perfuma,
ja as cinzas da morte gera dissolução.
Um dia, poderei ver a vida
sem as nuvens escuras da ilusão
e sem as vertigens do medo,
este medo que domina e assombra
as noites de desnsa escuridão.
Um dia, voltarei a ser criança
e os sonhos conspirarão
no caminho do amanhã,
Então, esverdeado de esperança
viverei cada dia,intensamente,
na certeza de que novos dias nascerão.
DELÍRIO
Jorge Bichuetti
Estive na lua,
de lá, me vi:
um homem
andando,
um pássaro
voando,
e um verme
orando....
Meus passos
seguiam
o caminho das flores...
Meu vôo
roubava
as cores do arco-íris...
Minha prece
celebrava
a fertilidade da vida...
Meu delírio,
lucidamente,
desnudava o explendor
da Terra, minha casa,
nunca vista,
e beleza da vida,
quase sempre nunca vivida.
Acordei e compreendi
que o desespero e a angústia
eram minhas alucinações,
e o mundo me esperava
para se florir e se fecundar
com os germes das minhas ilusões.
BONS ENCONTROS: ARTE, COMO DISPOSITIVO / JOSIANE SOUZA
ARTE COMO DISPOSITIVO – SINGULARIDADE E CIDADANIA
jOSIANE SOUZA
Como pensar a arte enquanto dispositivo para a produção de singularidade e cidadania?
Nietzsche em “Assim Falou Zaratustra”, profere que o significado da criação se encontra na metamorfose da realidade, e alertou para o fato de que não se cria porque falte algo, e sim pelo próprio ato de doação e amor pelo que se cria.
Desta forma, não podemos reduzir a criatividade a um mero produto de processos psíquicos de recalque e sublimação ou de uma falta que gera um desejo ligado único e exclusivamente à cena primária descrita pela psicanálise.
O fato elementar que resulta em um devir ou em uma ação, é para Nietzsche a “Vontade de Potência”, entendida pelo filósofo como auto-superação da vida se projetando para além de si mesma.
Quando o mesmo filósofo disse “Deus morreu” se referindo a um acontecimento histórico ocidental marcado pela descrença no Deus cristão, desafiou-se todos os homens a pensarem se conseguiriam ocupar esse lugar de “criador” deixado pela idéia de um Deus soberano e transcendental.
Por se acreditar que a criação dos valores e sentidos da vida são atribuídos a um criador único, por uma verdade absoluta ou metafísica, o homem torna esquecida sua capacidade de criar, caindo dessa forma nas malhas do aniquilamento, de assujeitamento e mortificação.
Assim, se os valores e sentidos são criados pelos próprios homens, sendo então, passíveis de interpretação e questionamento, logo a função de criador, de artista, leva ao que Nietzsche chamou de “Afirmadores da Vida”, como cidadãos que fazem da própria existência uma ou múltiplas obras de arte.
Foucault se refere à arte como propulsora da singularidade, enfatizando que a partir do momento em que a ética moderna passa a ser esculpida pelo desaparecimento da obediência alienante aos códigos vigentes, esta passa a abarcar em seu seio a estética da existência, pois, se já não cremos em uma essência definidora da natureza humana, se não compartilhamos de uma única moral, então há de se conceber a relação consigo mesmo e com os outros a partir da auto-criação.
A estética da existência de Foucault, portanto, caminha em direção a uma ética na qual a vida seja produzida como obra de arte, em atos que dancem, em palavras que cantem ou entoem uma poesia, em pensamentos multicores que não estejam contaminados por uma fidúcia acromática, apresentando-se no palco da vida como atores/autores da própria peça, na qual possa encenar múltiplos personagens em um eterno devir.
A arte, portanto, permite-nos resgatar o que esquecemos com nossa adesão ao mundo da racionalidade, a saber, a paixão humana, na qual permanece adormecido um estróino abismo de perceptos e afetos que Deleuze e Guattari caracterizaram como sendo propulsores de devires que movem o desejo e são capazes de produzir novos agenciamentos coletivos em prol da singularidade e cidadania que afirmem a vida.
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