domingo, 28 de fevereiro de 2010

SOCIEDADE DE AMIGOS: POR UM DEVIR POÉTICO...

DEVIR, POESIA E AMORES... AMORAS...


EU, DEVIR MAR...

                                                                               LINCOLN ALMEIDA



O mar da minha terra, me lembro, era feito de cristais líquidos de pura safira que batia macio, vadio, irado no peito.
O sopro de vida das marés o agitava salgado na pele ainda alva e tenra...
A princípio não tive olhos pra vê-lo - a infância pulsante seduzia mais:
não vi que estava comigo nas veias,
até que a espuma, brumas e areias
atravessaram de vez o espírito,
se uniram aos cordões do meu sangue,
falaram pela minha boca,
me tornando, por fim, mar também...


HÁ UM PASSO DO ABISMO

                                                                               JAMIRA BARBOSA



... O vejo tão perto, me aproximo.
Tento tocá-lo, não dá;
me aproximo mais e mais...
Você... um imenso abismo.

Não consigo ultrapassá-lo,
você foge. Não me ajuda
a vencer, vencer o abismo,
o abismo que existe entre eu e você.

Olho seus olhos e não vejo brilho...
Sinto sua respiração sem nenhuma emoção...
Sinto seu corpo frio, sem calor...
Sinto você perto, mas tão longe...
Tão longe e tão perto...
Minhas emoções já não posso colocá-las em palavras.
Não mais...

Estou me perdendo
na escuridão da luz dos seus olhos
no frágil aperto dos seus braços
no calor do seu beijo frio
no seu doce amor renegado...

Me perdi
no seu pequeno imenso abismo
na sua indiferença
no seu gelado amor...

Estou a um passo do abismo.
Estou... a um passo de você.


Herança

                                                                                   Lia da Silva Mocho



A cara do pai
O andar do tio,
Um irmão que sumiu no mundo...
O anel de noivado da prima
Que morreu solteira...

No quarto dos fundos
O choro das viúvas
Embala o sono dos filhos
Não nascidos.
Quarto de despejo,
De sonhos e lembranças
Bordados em lençóis de linho
Que o tempo se encarrega de desbotar.

Retalhos de vida
No silêncio varridos
Para baixo - bem fundo- da pele.



             Álamo
 Lia da Silva Mocho

Sagrada forma
Vegetal pintura
Bela palavra sonora verde
Ao vento baila!

Doce álamo, ensina-me!
Os frutos maduros repartir
Os sonhos pequeninos cultivar,
As folhas,já cansadas, deixar ir
E em tua leve sombra descansar...



SONETO SOBRE O DIA DE HOJE:

                                                                    Alexandre Lacerda Alves


O dia de hoje não possui memórias,
Como se ontem não tivesse existido,
Nem deixado registro ou histórias,
Como sonho estéril e descabido.

Que dia é este tão misterioso afinal?
Qual seu tom, sua rota ou vibração;
Desprezado como fruta podre no quintal,
Ou baile sem festa, música ou animação?

Como co-existir hoje sem ontem,
Amanhã sem o fruto de agora:
Quimera inútil que o demônio adora;

Porque se de fato é o que se diz,
O dia de hoje é aviltada utopia...
... pois é hoje o dia de amar e ser feliz.






                                                                         

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