sábado, 18 de setembro de 2010

DIÁRIO DE BORDO: QUE FAZER?

                                                                                 JORGE BICHUETTI

Ontem, minhas madrugadas eram com violas, serestas e vinho.
Hoje, espero - eu e a Lua - a alvorada dos pássaros, entre livros, sonhos e a certeza de que a estrada é meu vício, minha companhia e meu céu.
Não sei voar, não sei cantar, não sei colorir... A alvorada me penetra com a esperteza da amante silenciosa que num instante de distração me rouba um beijo.
Beijo de mel, jaboticaba, gabiroba...
Beijo de terra molhada, anunciando um novo dia.
A fumaça do meu cigarro, hereje, sobe aos céus como se fosse a mais constrita oração.
E na espera do sol, me pergunto: que fazer?
Ah! eu quero tanto, e posso tão pouco!
Eu quero romper com a culpa e o ressentimento esta herança judaica-cristã na sua versão romana que desconhece o sangue e as virtudes dos mártires...
Eu quero deixar meu ego na primeira lixeira que encontrar, para poder devir-me singularidade e multiplicidade numa rede de afirmação da vida...
Eu quero negar-me quando a sedução da competição, do consumismo, do egoísmo e da posse surgirem nos seus cantos de sereia...
Eu quero cantar, bailar, sorrir e semear e devir amizade, principalmente, junto dos olhares desconhecidos que famintos de afeto rogam em preces mudas o abraço de irmão...
Eu quero ser a solidariedade e generosidade, a compaixão e a misericórdia, a ternura e a simplicidade...
Eu quero o banho de cachoeira e os meus pes no riacho...
Eu quero dizer, gritando: Não à guerra!...
Nada disso conseguindo, eu quero... poder continuar caminhando para que um dia eu possa ser o amor, e aí, nada me deterá, porque terei comigo a magia e poesia que une a Terra ao Céu e o Céu à Terra, numa partilha que muitos chamam fé e outros apenas nomeiam como " somos amigos.".

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