Como a Morte se Infiltra
JOÃO CABRAL DE MELO NELO
Certo dia, não se levanta porque quer demorar na cama. No outro dia ele diz por que: é porque lhe dói algum pé. No outro dia o que dói é a perna, E nem pode apoiar-se nela. Dia a dia lhe cresce um não, um enrodilhar-se de cão. Dia a dia ele aprende o jeito em que menos lhe pesa o leito. Um dia faz fechar as janelas: dói-lhe o dia lá fora delas. Há um dia em que não se levanta: deixa-o para a outra semana, Outra semana sempre adiada, que ele não vê por que apressá-la. Um dia passou vinte e quatro horas incurioso do que é de fora. Outro dia já não distinguiu noite e dia, tudo é vazio. Um dia, pensou: respirar, eis um esforço que se evitar. Quem deixou-o, a respiração ? Muda de cama. Eis seu caixão |
Nenhum comentário:
Postar um comentário