Jorge Bichuetti
Madrugado: frio e corpo febril... Tão-só uma gripe... Porém, um contato com a fragilidade do corpo e com a beleza e nobreza da minha pequena Lua. Ela não suporta o barulho da tosse; é um vozerio ensurdecedor para a delicadeza da sua audição. No entanto, abandonou seu brinquedos e me nina e me faz companhia... Um terno gesto de fidelidade e amizade... Vi hoje de longe os álamos; notei o movimento dos pássaros... A quietude da noite, silenciosa e fria, me revela que o turbilhão de atividades da nossa rotina , não nos permite ver, pensar e pesar a vida que temos vivido.
Assim, no silêncio, me pus a questionar: o que temos parido pelo caminho?...
Num balanço, quais são os verdadeiros investimentos da nossa vida?...
Muitos vivem e gastam todo o tempo e toda a energia, querendo esculpir a beleza maior nos seus corpos... Malhação, cosméticos, massagens, tratamentos cirúrgicos... Toda uma vida pela beleza. E quase por uma beleza que veio do fora, dos padrões midiáticos... com pouca ou nenhuma exploração da beleza que existe em cada singularidade. Uma estética corporal e midiática... Gastar todo tempo com a busca da beleza não é crime, nem pecado... é uma tática de vida vulnerável , pois, o tempo passa com voracidade e a velhice encontrará estes que assim vivem, despreparados, vazios, para uma vida de lentidão, serenidade, reflexão, diálogo... Quando algo dificulta nossa vida exterior, enlouquecem os que vão parindo pelo caminho uma estéril e pobre vida interior.
Outros passam seus dias acumulando bens e poder... Ricos e poderosos, se crêem completos, donos do mundo... Não percebem que mercantilizam todo o seu universo existencial. E um dia, no imprevisível do destino, se encontram com a vida que pariram... Muito ouro, nenhum amigo... Muitos bens, nenhuma gratidão...
Felizes os que vivem intensamente parindo no caminho uma vida de diversidade e de solidariedade.
Quem usa o tempo para viver o fora e o dentro; para o corpo e a alma - serenidade e arte... vão parindo modos de existir e vínculos que se mantém potentes e inabaláveis ao longo do caminho; não pulverizados pelo vendaval da transitoriedade que perambula no redemoinho dos minutos. O tempo passa, mas não aniquila a vida parida.
Aqui, estou... na passagem. Deixo a juventude e penetro no outono da existência... Olho, me escuto e percebo uma grande e suave calmaria.
O que farei na velhice?...
Trabalharei... cuidando dos que muito sofrem e de dor se enlouquecem...
Escreverei textos e poesias... falando da vida e da alegria de ser ternura e solidariedade.
Estarei com meus amigos...
Lento,desatento e frágil, mas caminharei...
E se algo me impedir de continuar servindo, penso que muito tenho por fazer...
Acordarei ouvindo uma sinfonia, lerei poesias, estudarei filosofia...
Conversarei com pássaros e plantas, com o luar e com as estrelas... Saudarei diariamente o sol...
Terei Rosa, Cartola e Pessoa... Cora Coralina, Mario Benedetti e Caymmi... Ouvirei canções, tecerei com palavras um novo verso. Viverei...
E se a palavra não puder estar na minha velhice, ainda assim não cairei no vazio... pois, algo poderia, então fazer: pensar e escutar... sonhar e contemplar com os olhos da alma a vida que é bela, se nela parimos o amor.
UNIVERSIDADE POPULAR - DIA 5 DE JULHO: GRUPO DE ESTUDOS
DIA 9 DE JULHO: ENCONTRO MENSAL
9 comentários:
bom dia, passarinheiro. No dia do CORPO DE CRISTO, desejo que sua gripe seja levada na leveza do espírito de sua partilha. Algumas madrugadas nos pegam desprevenidos, e esquecemos que a eternidade de CORA CORALINA é partilha, é pão da terra colocado farto nas mesas sem nada pedir... abração. Paulo
Paulo; o carinho é força na qual a vida se revela: mãe e ternura para os novos passos da caminhada. Abraços com desejos de alegria e paz, jorge
Que elegância amei...essa é a gripe mais chique rs...Melhoras meu querido e um feriado de muito amor!apesar da gripe amei o texto.
Rosi: obrigado... irei ver filmes e escutar canções; depois, lerei poesias e um texto. Assim, povoarei de sonhos meu canteiro de flores, abraços, jorge
Bom dia meu querido amigo Jorge!
Parei aqui um pouquinho para pensar no que ando parindo...senti o desejo de continuar ajudando aqueles que cercam o meu caminho e outras tantas coisas boas...vamos aqui nutrindo...Abraços cheios de ternura...com carinho, Mila.
Cuide-se, viu?
Nossa que gripe. Se estivesse aí cuidaria de você com muita dedicação. Conte com a minha presença na tua velhice, mesmo que distante, pois envelheceremos juntos, temos a mesma idade, substanciais experiências e sintonia perfeitas. Você é um amor e merece todo o meu carinho! Beijos
Mila, já temos conseguido dialogar; saudades... Parier carinho e solidariedade é azular o horizonte. Abraços, jorge
Tânia, estou de cama há tres dias, dores e coriza, febre e tosse: Lua anda do meu lado, vigiando... Depois, perde o sossego e ladra... Queria conversar, trocar: sonhos se sustentam na partilha... Verei se hoje , já consigo sair da cama. Seu carinho me alenta, abraços, jorge
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