quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

sobre o amor

SOBRE O AMOR E O AMAR

                              Jorge Bichuetti


O consultório de um psiquiatra se vê, frequentemente, visitado por uma demanda que se universalizou, nos tempos modernos, e se tornou lágrima, desencanto, tédio e desespero: a crise das relações afetivas.

E como não podemos nos furtar à obrigação de enfrentar o desafio de refazer o objeto da psiquiatria subtraindo a visão arcaica que cuidava de doenças e agir, sabendo que é preciso definir como campo de atuação do profissional psi a existência-sofrimento e sua conexão com o social, esta questão-a dor amorosa-exige acolhimento.

“Qualquer amor já é um cadinho de saúde, um descanso na loucura”, fala-nos Guimarães Rosa. “Qualquer maneira de amor vale a pena”, grita o canto das Geraes.

Assim, podemos inferir que toda vivência de desamor é um caos, uma desordem interna, um sofrimento de uma intensidade tal onde a pessoa se percebe diante dos fantasmas da loucura e da morte.

O amor vitaliza, dá chão, e multiplica flores e estrelas na estrada de nossas existência.

O amor organiza o nosso cotidiano, dá destino, e provoca no homem a capacidade de criar na finitude de uma existência a alegria e paciência de ser e estar na infinitude da vida que se transforma, enriquecendo-se na sonoridade sinfônica da história.

Se o amor é tão vital, por que o tememos tanto? Por que o fazemos gestar tantas dores? Afinal, por que tanto desamor?

Recordo, aqui, uma canção: “O medo de amar é o medo de ser... de ser livre”. (Beto Guedes)

Ah! Queremos liberdade, e a evitamos? Sim, por mais paradoxal nos pareça esta situação, ela é, e é de fato.

No amor, o homem depara com as dificuldades de gerir a sua socialização. Ser com outro, sem se perder; e ser com o outro, sem sufocar a possibilidade do outro ser por si mesmo.

Todavia, todos nós queremos, queremos “a sorte de um amor tranquilo/ com sabor de fruta mordida”. (Cazuza)

Que fazer, então, da dor amorosa? Do cíume, da possessividade, da dependência? Da dor de uma perda? Que fazer...

O homem precisa aprender a amar. Para tanto, necessitamos de romper com as limitações do nosso modo de funcionar. Romper com o amor-dependência (narcísico-simbiótico); amor-propriedade privada (dominação - exclusividade); amor-exclusão (único e fora do mundo e de seus acontecimentos).

Um novo modo de amar: para amar muito, muitos... amar na relação afetiva, mas também, amar a comunidade, a natureza e o cosmos.

Amar, viabilizando-se devir... ternura, cumplicidade, solidariedade recíproca. Confiança. Amor-aliança. Aliança com o outro e com a vida.

Assim, sobre o amor e o amar estaremos numa lida, já não mais no domínio do arquétipo-calvário, e, sim, amando num caminhar contaminados pela benção da paz. Isto é, cantando: “mora na filosofia, prá que juntar amor e dor”.

2 comentários:

Priscila Almeida disse...

Sábias palavras Jorge!!!
É importante destacar o trecho sobre as diferentes formas de amar, onde vc diz " ... amar na relação afetiva, mas também, amar a comunidade, a natureza e o cosmos."
Para que limitarmos o amor se ele pode ser tão amplo... Às vezes jogamos a responsabilidade do amor nos outros e isso não é uma coisa que devemos encontrar em outras pessoas, é simplesmente uma luz que existe em nós e somos nós que determinamos a intensidade desta irradiação...
Em Jesus: "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei."

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Priscila, o amor é fonte de vida, é partilha,é caminhar... , juntos e separados, no vôo dos sonhos que se multiplicam... É alegria, é lágrima... É a mediação que nos permite transitar do narcisismo para a solidariedade, que é ele plenificado... jorge bichuetti