sábado, 9 de outubro de 2010

DESEJO, N SEXOS E OS NOVOS MODOS DE AMAR (III)

                                 POR UMA NOVA SUAVIDADE
                                                                                  JORGE BICHUETTI

O amor heterossexual e o homerótico não romperam com o falocentrismo, com a edipianização e com as fantasias, conscientes ou reprimidas) do amor cortés, num contexto de culpa e ressentimento que o faz trágico, seduzido pela impossibilidade/proibição.
Temos sidos romeus e Julietas...
A invenção de um novo modo de amar, uma nova suavidade, que Guattari nomeou de solidão compartilhada, exige que nos aventuremos na superação do narcisismo e adoção de um funcionamento solidário, e que abandonemos as totalizações onipotentes que lidam com a necessidade de infinitude e incorporemos as liberações oriundas da admissão da finitude, como elemento inerente à vida.
A simbiose mata o amor... esgotando-o, já que reduz o conjunto-contesto-construção e o torna repetitivo, esvaziado de vivências do fora já que fecha em si mesmo e, assim, sufoca e é sufocado.
O narcisismo dissolve o amor... dissolvendo o outro, o entre e o encontro, já que um é o espelho das projeções do outro e neste misto de identificações e projeções, acaba sendo um limite e uma limitação aos fluxos da vida, e onde deveria gerar um nós, cria eu-eu paralizante e anesteziante, desvitalizado e desvitalizante.
Busquemos novos modos de pensar e vier o amor e o amar..
Amor é vínculo, encargo e corrsponzabilização; é cuidado, é ternura, é construção diária de encantamentos; é doação; é cumplicidade e partilha; é encontro - bons encontros e paixões alegres...
E necessita ser espaço liso de singularização e subjetivação: cada um precisa sair para voltar, e no reencontro, poder enriquecer -se e enriquecer.
Ousaria, parafrasear, Emerson Merhy dizendo que o amor necessita ser capaz de alegrar e se alegrar, frustrar e se frustrar...
O amor é continente...
Cabe, nesta reflexão, agregar alguns pensamentos de Nietzsche:
-Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal.
 -Em última análise, amam-se os nossos desejos, e não o objecto desses desejos.
 -O amor revela as qualidades sublimes e ocultas do que ama, - o que nele há de raro, de excepcional: nesse aspecto facilmente engana quanto ao que nele há de habitual.
 -A vontade se superar um afecto não é, em última análise, senão vontade de um outro ou de vários outros afectos.
 -A sensualidade ultrapassa muitas vezes o crescimento do amor, de forma que a raiz permanece fraca e arranca-se facilmente.
 -O amor por um só é uma barbaridade: porque se exerce à custa de todos os outros. O mesmo quanto ao amor por Deus.
  Pensemos, levando em conta que o amor e o desejo é construtivismo.
Acrescenta Arduini: 
“ A sexualidade tem afinidade com a alegria. Nela, não deveria haver amargura e remorso.” Ousar, p. 125
E, assim, Spinoza parece ser alguém muito útil na invenção de um novo modo de amar: amar- como encontro de verdade e amar na beatitude do auto-amor...

E diante dos dilemas, dores e dúvida, tão próprias ao campo do amor, escutemos Marta medeiros e seu poema:
PEDAÇOS DE MIM

Eu sou feito de
Sonhos interrompidos
detalhes despercebidos
amores mal resolvidos

Sou feito de
Choros sem ter razão
pessoas no coração
atos por impulsão

Sinto falta de
Lugares que não conheci
experiências que não vivi
momentos que já esqueci

Eu sou
Amor e carinho constante
distraída até o bastante
não paro por instante


Tive noites mal dormidas
perdi pessoas muito queridas
cumpri coisas não-prometidas

Muitas vezes eu
Desisti sem mesmo tentar
pensei em fugir,para não enfrentar
sorri para não chorar

Eu sinto pelas
Coisas que não mudei
amizades que não cultivei
aqueles que eu julguei
coisas que eu falei

Tenho saudade
De pessoas que fui conhecendo
lembranças que fui esquecendo
amigos que acabei perdendo
Mas continuo vivendo e aprendendo.
Martha Medeiros
Sim, amar-desejar, envolve experimentações e libertações...
Neste momento, apenas cantaria: " mora na filosofia, pra que juntar amor e dor..."
Segundo Arduini: o amor é obstinado, é busca insaciável, esforço infatigável; é afetivo e efetivo; é insubmisso..
E conclui: "O amor extasia, canta, dança, porque é beleza, é maturação da vida.O amor afasta o desalento e encoraja a partir para buscar o novo dia, para" acordar a aurora" da nova humanidade." Ousar, p.116
Assim, vamos... com a coragem de gritar: " eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida"... Ou, " que seja infinito enquanto dure"... Amém!...
E como todo amém é uma busca de vida, concluo com es te belíssimo poema de Lia Mocho:
O Amor me fez criança que brinca de viver e sonha colher flores no deserto...  Escondida em versos, ensaio passos enquanto o céu se veste de lilás e rosa ... Um Amor cigano, de cartas embaralhadas me fez linhas de fuga nas linhas da mão. Jardineira de encontros, multiplico meu amor e nele me inspiro. Enxertos coloridos enfeitam meu coração errante que segue amando, ao som de um violino imaginário... De vez em quando acampa, faz fogueira, festa e baila... às vezes chora lágrimas de vinho tinto e se embriaga de sofrer.  Amanhece: criança renascida, me batizam no rio largo que em meu peito corre. Das cinzas minha alma lavadeira, inventa um canto doce, ensaboa a alma para a dor passar. E assim vou descendo as águas  devindo peixe, planta, seixo rolado e saudando a Lua -dos amantes- em seu reflexo prateado até um dia desaguar no Mar imenso. ( lia Mocho)
 



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