DIÁRIO DE BORDO: EXISTIR É REINVENTAR-SE NO CAMINHO...

                                         Jorge Bichuetti

De pé, miro a vida... A vida é encantamento do infinito que brota fecunda nas vielas do existir... Ela floresce, enternece... Ela nos tece... Basta que não fechemos as janelas do coração... Chega, inunda-nos de novo ânimo, vitaliza-nos e nos revela no belo e singelo da natureza caminhos encantados... Caminhos que levam ao encontro da alegria que oxigena a própria existência e fertiliza os sonhos dos que buscam nos passos da caminhada as luzes do alvorecer...

Alvorece... Um novo dia chega... Miro as estrelas que se despedem... como se nos entregassem aos cuidados do astro-rei... Ele vem de mansinho inaugurar um novo dia: novos encontros, novas tarefas... E em cada minuto, uma nova oportunidade de na vida renascer... Renascer paz, esperança, ternura, desejo de lutar... vida nova no projeto de caminhar, transformando a realidade, dando-lhe novos rumos...

Aqui, no quintal... com a Luínha aninhada no meu colo, contemplando a beleza da vida, impregnado pelo perfume da manhã... Sinto no orvalho a vida me impregnando de forças e restaurado, me pergunto: que sentido desejo dar ao meu dia?... ...

Somos o que esperamos...

Somos o que buscamos...

Somos o que tecemos...

Existirmos a que será que se destina? - ressoa o questionamento da canção, como se os dias do passado olhassem para o meu presente... e neste olhar houvesse todo um compêndio de filosofia... 

Penso, reflito... Sim, de fato, somos inacabamento; criámos o nosso destino... Tecemos com as próprias mãos os fios da nossa história...

Se vivemos com ternura e alegria, compaixão e compreensão, uma rede de amigos vai se conectando com a nossa vida e ele passa a contar com novas fontes , novas pontes... Novas fontes de inspiração e de sustentação... Novas pontes de superação e de saltos sobre as pedras e espinhos que antes inibiam nosso caminhar... Gestamos um con-viver que é alimento, estímulo, aconchego, ideias e ideais, mão e ombro... Alicerce, cais... Ninho, impulso...

Se nos isolamos, tendemos a repetir com a mesma vulnerabilidade de antes a vida vivida até então... Nos cristalizamos... Ficamos estáticos... Alheios aos movimentos renovadores do novo dia.

Recomeçar é renovar-se... se queremos um existir que seja crescimento, intensificação da alegria e da nossa potência de criar e procriar vida remoçada...

Evitemos existir como a folha que se deixa se levar, passivamente, pelo ondear do vento; governemos nossa existência dando-lhe sentido e direção...

A página que lemos, os diálogos que mantemos, os amigos que cultivamos... as ideias e sonhos que criámos no nosso mundo mental... juntos irão compor o material com o qual inventaremos sentidos e daremos direção ao dia que começa...

Mudar não é apenas um ato expontâneo do desejo inerte. A mudança pede ação e a ação exige um contexto...

O que ouvimos, o que falamos, as trocas que efetuamos... Nosso sorriso ou nosso mal humor... Nossa esperança ou nosso desespero... Tudo que elegemos como companhia da nossa caminhada age e interage criando um contexto que facilita, ativa e atiça nossa mudança... Ou funciona como reforço dos bloqueios e limitações íntimas que necessitamos superar para voar sobre o abismo da nossa pequenez e alcançar na outra margem o caminho florido da vida de alegria e paz, solidariedade e amor onde nossos passos seguirão leves e alados na direção do horizonte azul de novo tempo de suavidade e serenidade, harmonia e esplendor que pulsa efervescente no coração da vida... vida plena na alegria de ser no caminho, um caminho para o amanhã...