A lua no céu, miúda e graciosa, é acalanto e nele eu encontro minha cantiga... De ninar, de brincar, de sonhar... A contemplei, reverenciando-me ante sua beleza e candura... As estrelas, poucas, me faiscaram o corpo e nelas senti-me um andarilho da imensidão... Brilho, encanto... O céu estrelado é um espaço onde o sonhar floresce, alteia-se e seduz... A Luínha, minha menina, quis ir comigo nesta pequena caminhada... na rua mirando o infinito.
Somos no dia-a-dia escravos... Escravos do relógio, da rotina, das preocupações, do pragmatismo, do concreto...
Assim, tecemos no caminho uma vida descolorida e árida.
Este conectar-se com o infinito me leva a perceber o que acontece conosco quando deixamos de existir orvalhados de sonhos.
O sonho é a magia da vida criativa que rompe com a nossa imersão no cinzento mundo de servidão e solidão...
O sonho anuncia que para além da nosso mundo... há a possibilidade de se inventar um novo mundo.
Um outro mundo... Um outro modo de existir...
O nosso mundo é mundo de exploração, opressão e mistificação... Nele, desconectamos com o universo, com os nossos próprios desejos e com os nossos sonhos...
Sonhar é indignar-se, ativamente... É um dizer não ao que existe, já contemplando caminhos de vida nova.
A utopia é desacreditada, marginalizada, ridicularizada... Ela é uma guerrilheira perigosa... Cria paisagens proféticas: anuncia e clama pelo novo e pela mudança...
No caminho, orvalhar-se de sonhos...
Eis o chamado da imensidão.
Romper com a apatia, com o conformismo, com o servilismo, com o niilismo, com o fatalismo, com a acomodação...
Sonhar é ver e sentir tocando a nossa pele a beleza e a grandeza de um outro mundo possível...
Muitos se focam no existente como realidade única, soberana e imútavel... e buscam nela serem vitoriosos.
Não questionam, não criticam, não indignam-se... Aceita, omissos e cúmplices, o mundo de desamor e exclusão.
Viver, orvalhado de sonhos e caminhar, semeando no percurso da jornada as sementes do porvir.
Os sonhos nos enternecem e nos ativam, nos recria... e seu orvalho na nossa pele, acorda o guerreiro adormecido.
Revela a podridão do egoísmo, da mais-valia, da exclusão...
Gera vontade de ação... Desejo de que mude a realidade... compromisso com a mudança necessária...
Sonhar é redescobrir a utopia terna da compaixão que nos motiva a lutar pela paz e pela justiça social...
E sonhar é, igualmente, ver e sentir que podemos viver sem medo de ser feliz...
A alegria - de todos e com todos - é caminho de solidariedade e partilha, luta e insurgência... vida rebelada na utopia da igualdade.
E o sonho é no psiquismo, individual e coletivo, um agente da alegria.
Portanto, diante do mundo de lágrimas e exclusão, escuridão e negação ética da vida , deixemos a vida orvalhar de sonhos a nossa pele... Orvalhados de sonhos, descobriremos a radicalidade do amor...
Amor que é a ternura de ver no outro, que sofre as agruras da opressão e da exclusão, um chamada da vida, da vida que sonha com um mundo onde as florescências do amor crie uma humanidade de paz na comunhão alegre da partilha e da comunhão...
Assim, impregnados pela ética do bem comum, não evitemos mais que a vida nos deixe orvalhados de sonhos nas trincheiras do caminho...
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