segunda-feira, 8 de agosto de 2011

BONS ENCONTROS: SOBRE A HOMOFOBIA; UM RELATO...

A Praça é nossa


Sempre me travesti à noite para ir a festas ou shows de amigos. Na madrugada, hora em que os contornos ficam indistinguíveis e os gatos são pardos, chego a convencer muitos com meu transformismo. Sou até revistada por seguranças homens na entrada das baladas e causo estranhamento ao usar o banheiro feminino dos bares.

  Por Vange Leonel

É bastante simples. Faço isso há anos. Não existem aqueles sujeitos que se vestem de mulher pra sair em bloco no Carnaval? Pois é: eu sou uma garota que gosta de sair de vez em quando personificando um rapaz, com bigode e costeletas pintados no rosto.

Sempre me travesti à noite para ir a festas ou shows de amigos. Na madrugada, hora em que os contornos ficam indistinguíveis e os gatos são pardos, chego a convencer muitos com meu transformismo. Sou até revistada por seguranças homens na entrada das baladas e causo estranhamento ao usar o banheiro feminino dos bares.

No último dia 19 de fevereiro, resolvi sair travestida para me juntar à manifestação contra a homofobia em São Paulo, cidade onde nasci e vivo desde sempre. Chocados com os últimos ataques torpes a homossexuais que ocorreram na nobre região da Avenida Paulista, um grupo diverso e suprapartidário de ativistas LGBTTs, políticos, ONGs e “civis” nos juntamos para protestar e pedir a rápida aprovação do PLC122, a lei que criminaliza e pune atos homofóbicos.

Achei que seria uma ótima oportunidade para experimentar sair vestida de homem, com costeletas e bigode, em plena luz do dia. Fiquei bem animada para testar a reação das pessoas à visão de uma moleca como adepta ao crossdressing. Para completar e radicalizar ainda mais meu teste, decidi ir à manifestação Anti-Homofobia de metrô.

Comecei meu processo de transformação: comprimi os seios com uma faixa elástica, coloquei uma prótese peniana macia por dentro da calcinha e saquei do meu rímel à prova d’água para delinear um par de costeletas e um bigode-lápis à Clark Gable. Jeans, camiseta, mochila, chapéu, óculos escuros e tatuagens à mostra: eu estava pronta para minha jornada.

A caminho da estação do metrô, os motoristas de táxi do ponto ao lado racharam o bico com meu visual. Tudo bem, pensei, um dia se acostumam com isso. Quem sabe até liberam a Jacira que mora dentro de cada um deles e experimentam um vestidinho bem fresquinho pra trabalhar na praça. Afinal, motorista sofre muito com o calor da metrópole paulistana.

Como era sábado, peguei um trem razoavelmente vazio e poucos notaram a elegância do meu bigode. Mas, chegando à concentração do ato, quando me juntei àquelas centenas de gays, lésbicas, drags, sapatas, trans e barbies, só ouvi elogios: “você está gato!”, “você está linda!”, usando todo tipo de gênero em pronomes e artigos quando se referiam a mim. Lindo. Isso me parece liberdade.

Depois da manifestação, descendo as ruas dos Jardins, cheguei mesmo a esquecer que estava de bigode. Pedi a dois manobristas que me indicassem um endereço, eles olharam, trocaram uma ideia sobre as ruas próximas e me responderam educadamente.

Acho que sabiam que eu vinha da manifestação. Perceberam que eu era uma mulher de bigode, mas diante da naturalidade com que levei a conversinha, logo se familiarizaram com a coisa.

É essa a fórmula. É esse o negócio. Com o tempo, e com leis que garantam proteção mínima, a sociedade poderá se acostumar com sua própria diversidade. É só se despir dos preconceitos e ver que por trás da roupa, dos peitos ou do bigode existe alguém bem parecido, e por isso mesmo, diferente de você.

Twitter: @vleonel

E-mail: vangeleonel@uol.com.br

FONTE: REVISTA FÓRUM 

"Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito." Albert Einstein





PELA APROVAÇÃO DO PLC 122 / 06










DIGA NÃO À HOMOFOBIA!!!..

PELA VIDA!

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