domingo, 21 de março de 2010

A LOUCURA: ONDE ANDA?

                                                                   SOMOS TODOS LOUCOS?

                                                                                               Jorge Bichuetti


O senso comum advoga: “de louco todos temos um pouco”. “De perto ninguém é normal” - eis a frase de Picasso, divulgada por Caetano Veloso na música “Vaca profana”.
Muitas vezes, sentimo-nos desnorteados, não nos reconhecemos na existência vivida. Estranhamos o mundo e nos estranhamos.
E esta vivência nos aterroriza. Tememos a loucura, um medo que nos revela as ilusões que permeiam o instável bem-estar do cotidiano dos homens.
Desejamos um veredicto, um diagnóstico de uma autoridade; um parecer de um psiquiatra que nos nomeiem como normais.
Ser normal, porém, no pensamento dominante é uma figura construída pela ilusão de que o homem deve se constituir como um ser da identidade, uma mesmisse, e um ser da racionalidade, um ser instrumental que se faz escravo da vontade reta e das paixões ortodoxas.
Vontade de ser disciplinado, prático, mercantil... Vontade de não sonhar, não criar, enfim, de não se diferir do modo de viver dado como natural: esta vida de mercadores, esta existência padronizada.
Do apaixonar-se como fuga da solidão, como dependência; posse e ciúme, exclusividade e repressão da própria afetividade.
O louco é o ser da desrazão; é o ser da alienação... Estes são os pressupostos para o nosso medo, medo que se transformou em ciência. O louco é uma doença, e é periculosidade...
E o nosso medo, ainda, torna-se maior quando tomamos consciência de que se vive num tempo aonde o hospício é o destino dos ditos loucos, um lugar de segregação e controle baseado nos processos de exclusão e na periculosidade.
Talvez, já estejamos em condições de escutar Rotelli: “O louco é, acima de tudo, um ser humano e a loucura é uma parte da sua existência”. “Combatemos a Instituição Total (o hospício) não só porque ela é violenta - ela poderia ser mais bonita, mais limpa - mas porque ela perpetua essa visão totalizante do que é ser louco”.
Deste modo, deixamos de pensar os loucos e os nossos medos, as nossas loucuras a partir da redução da loucura à doença mental e refletimos sobre os nossos problemas, nossas insatisfações e, também, as dores dos doentes mentais reconstruindo o objeto da vida, na sua problemática psiquiátrica, centrando-o não mais na doença, no medo, na periculosidade, mas na “existência - sofrimento dos pacientes e sua relação com o corpo social”.
Somos todos loucos? Somos seres diferentes e singulares, somos muitos...
O “ser é agir” - diz Sartre.
Agir é transformar e se transformar.
Somos um agir, um caminhar, e no agir, a vida e suas emboscadas, no caminho, as pedras e encruzilhadas.
Normais? Somos a dor de quem se enlouquece e na dor de cada estranheza, o agir capaz de reconstruir o mundo para além da normalidade que nos tem infelicitados.
Somos... o humano...

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