sexta-feira, 5 de agosto de 2011

BONS ENCONTROS: JORGE AMADO; ENTTREVISTA - A FÉ NO AGIR MILITANTE...

LC - Aliás, você é um dos doze Obás da Bahia, não?
JA
- Sou, o Carybé é outro e o Caymmi também. E não é por aca­so. Tenho vários títulos, um título dado por Joãozinho da Goméia, Ogan de Iansã no candomblé da Go­méia. Joãozinho foi meu amigo e seu caboclo Pedra Preta foi herdado pela minha amiga Mirinha do Portão, que dançou tão bonito outro dia na festa do povo pra Carybe. Es­sa gente toda é minha amiga, eu sou um deles.
Não é por acaso que tenho esses tí­tulos. Desde criança eu vivo mistu­rado com o povo dos candomblés. Em 43, quando a polícia do Rio me soltou e me forçou a viver em Salva­dor - e eu vivi aqui até 44, dois anos -, não fiz outra coisa senão ir à polícia buscar as armas de santo e as coisas todas dos candomblés que a polícia invadia, tomava os emble­mas sagrados e os levava. Eu ia lutar para tirar meus amigos da ca­deia ... Fui amigo de Procópio, de Aninha, a mãe- de-santo Aninha, uma figura extraordinária de mu­lher. Quando ela morreu, em 38, o enterro dela foi acompanhado por 5 mil pessoas, um enterro nagô, mag­nífico.

LC - Logo depois disso, Jorge, você se ligou ao Partido Comunista, um par­tido marxista, materialista ...
JA
- Em Tenda dos Milagres, que é o romance meu de que mais gosto, a certa altura, o professor de medici­na pergunta a Pedro Archanjo como é que ele, sendo um materialista, conciliava isso com sua atividade no candomblé. Pedro Archanjo respon­deu que "o meu materialismo não me limita".
Eu sou materialista, mas meu ma­terialismo não me limita. Então, se o povo dos candomblés me dá um tí­tulo e eu aceito, eu tenho que cum­prir as obrigações desse título. Se­não, eu não estaria tendo com eles o mesmo tipo de relacionamento, de amizade que eles têm comigo. Por is­so, quando entro no Axé Opô Afon­já, com meus colares, faço tudo o que tenho que fazer e faço exatamen­te tudo com o maior prazer... Eu não poderia escrever sobre a Bahia, ter a pretensão de ser um romancista da Bahia se não conhecesse realmen­te por dentro, como eu conheço, os candomblés, que é a religião do povo da Bahia.

FONTE: LITERATURA COMPARADA

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