sábado, 13 de agosto de 2011

DIÁRIO DE BORDO: EN-CANTOS DA ALEGRIA...

                                         Jorge Bichuetti

Lua prateada vigiando, no silêncio da noite, os sonhos de alegria da humanidade que caminha e voa, buscando, aqui e acolá, um cadinho de coragem para no existir, lutar...
Meus álamos me inspiram... Altivos, miram além... No chão, a roseira e a relva perfumam meu quintal; um cantinho de serenidade e transcendência; quase um altar... O limoeiro, orgulhoso, da multidão de frutos, fala com sabedoria de Apolo e Dionísio, conta na virtualidade da tequila e da cachaça, das saladas e dos sucos que ele é sambista por tabela: me recorda a alegria da vida quando na folia o canto do povo seca lágrimas e alteia a esperança... pedindo u' vida que fosse um permanente carnaval, riso e comunhão.  Com desculpa, de fazer um dengo na menina Luínha, ligo o som, e a casa se ilumina na voz de Cartola... Luínha me olha, receosa, penso que teme que irei impedir se último cochilo do dia... Não, irei... abaixo som e agora a mangueira canta no meu coração...
O capitalismo para que as correias das máquinas fabris funcionassem, acumulando riquezas... calou o canto e a dança de Dionísio no dia-a-dia das nossas labutas... Criou mecanismo de subjetivar o ser humano um existir apolíneo.
A alegria tornou-se perigosa... agora, só poderia surgir em dias e espaços restritos; e, assim, nos tornamos homens cinzentos...
Tudo passou a ocorrer sob o signo da tristeza, peleja e labuta... Divorciaram desejo e produção... Instituiu-se o riso cometido,, bem comportado...
O mundo anda cinzento e triste... Não se vê no alto as pipas coloridas valseando num cirandar celestial... no chão, não mais encontramos os rodopios dos piões, o vai-e-vem das bolas de gude, os painéis estelares que nasciam das bolhas de sabão, as cantigas de roda, as serestas e serenatas... A fogueira de São João, as festas... já não acendem a alegria no existir, agregando todos numa vida de comunidade...
A festa... e a magia da vida de alegria foi plastificada e empacotada; ficou secura e solidão.
Escravos do trabalho e da previdência... vivemos submissos a vida robotizada e solitária para acumular algo que será um dia usado... num depois que nunca chega.
O trabalho devia ser criatividade, ação solidária e alegre, vida... Virou trabalho alienado, cansaço e dissabor...
E sem alegria a vida foi-se atrofiando e não conseguindo barrar a fúria de Thanatos na sua luta para calar Eros...
Assim, hoje, temos um mundo triste, cinzento, de solidão, desamor e violência...
Esquecemos das lições de Espinoza... A alegria é força que nos compõe e nos compõe corpos de potência na afirmação da vida... e ela, a alegria, flui e move os bons encontros.
Ela é o sangue da vida...
Com tristeza, vemos que sem alegria temos perdido as batalhas pela vida...
Na memória, me passa como um filme nossa derrota...
Vejo crianças com hiperatividade; jovens mutilados pelo crack; adultos com depressão e fibromialgia; velhos com a cronificação da tristeza nos tumores e nos casos sanguíneos endurecidos... Vejo o bullyng e a violência... a exclusão e a desvalia...
Ou reinventamos os en-cantos da alegria ou caminhamos para uma generalizada barbárie... Barbárie corporal, social, e da natureza...
É por isso que necessitamos, retomar Guimarães Rosa e lê-lo para reinventar nosso socius: escola, família, comunidade , políticas públicas...
Eis a sabedoria de Rosa: 
- " O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito - por coragem."
E, assim, reflitamos sobre o que pode alegria... ouvindo com carinho a voz do morro:


Nenhum comentário: