Jorge Bichuetti
Muitos enxergam na utopia a neblina da ilusão...
Talvez, seja... para o pragmatismo, para fatalismo e para apatia negativista da vida vista alijada da potência da história.
Cartografamos o mundo, os universos do cotidiano e do desejo... Negamos a visões totalizantes da vida suprimida na história.
Corremos agora o risco de pela exclusão de estar produzindo outra totalização: o ser humano e a sociedade vistos pela cartografia, pelos fluxos que se movem na geografia dos diversos territórios não exclui, nem nega a produção histórica da vida e o ser humano como agente da história... Acrescentamos um platô, mil platôs... Inventamos um olhar multiplicitário. Porém, somos atravessados pelo absolutismo e, assim, muitas vezes, não percebemos a potência revolucionária de se ver e se sentir agenciador dos devires no caminho, no meio da história.
Utopia é esperança e caminho, não é ilusão...
O acontecimento não tem autoria, mas não emerge do expontaneísmo; frutifica-se e fertiliza nos múltiplos agenciamentos que alisam a vida e o torna possível.
A virtualidade se atualiza, vira realidade, via afirmação divergência e criatividade.
Esta assertiva de Deleuze revela-nos uma viés político para a atuação dos que entendem inclusive que as revoluções molares e moleculares são imanentes.
A negativa da totalização no partido de vanguarda, núcleo fundante da mudança, não pode nos induzir a uma perspectiva de vida longe da luta pelo novo, pela liberdade, pela justiça, pela utopia...
A esquizoanálise não existe fora de uma luta revolucionária, por uma vida não-fascista, por uma nova Terra, por povo por-vir...
Me desculpem por texto, sem sentido: é que as vezes penso que necessitamos de nos recordar que somos um pensamento pulsante e libertário, revolucionário, um semente-fruto da utopia socialista.
domingo, 1 de maio de 2011
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10 comentários:
Jorge
Acho que a frase que resume, com perfeição, este teu texto é:
"Utopia é esperança e caminho, não é ilusão."
E eu grifaria 'caminho' e acrescentaria 'vontade'. Temos que ter vontade e permitirnos caminhar na direção da utopia.
beijão
Anne
Anne, como é bom iniciar o dia, conversando contigo, a vida nos chama, vibra e pulsa, nela sentimos o horizonte do novo, da mudança. Sim, é preciso de vontade e compromisso para caminhar na direção do horizonte.
Abraços com imensa ternura; Jorge
Seu texto é pleno de sentido e, não sei lá porque resolvi citar Dom Casmurro , na figura de Bento.
Bento passa sua vida, no romance, como um morto vivo, dissimulando suas ações.
Bento e a morte, entrando pela porta do imaginário, se torna sua companheira de todas as horas.
Mas, Bento guarda uma certa vocação hamletiana. Pois Hamlet de fato hesita.
Bento ingressa, como espectador, na cena da tragédia de Shakespeare. Enquanto assiste à representação do Otelo, ocupa-se em remoer os seus ciúmes e repassar os indícios da possível culpa de Capitu. E como não podia deixar de ser, o drama em si mesmo descreve diante dos olhos de Bento um contra-argumento chamando à razão, através do seu desfecho, seu espírito transtornado. Como em outros lugares, aqui também, a voz da razão exibe sua impotência.
A fantasia de ação de Bento, motivada pelo ciúme, apresenta caráter hiperbólico — não apenas matar, mas matar com uma morte absoluta: “era preciso sangue e fogo, um fogo intenso e vasto, que a consumisse de todo, e a reduzisse a pó, e o pó seria lançado ao vento, como eterna extinção...”. Será casual que esta ação extrema, cujo escopo paira para além de todo definido, tenha como contrapartida uma igualmente absoluta impotência para realizar?
O fato é que nos dramas de Shakespeare vemos as querelas dos motivos contrários, as decisões e a consumação dos atos. De atos que resultam, com freqüência shakespeariana, em morte.
Ao contrário, no Casmurro, a frase vai sempre além, muito além, como diria Marx, do conteúdo. A cada momento, é sob o signo de uma ação que se frustra ou trai, que caminha o desenrolar do novelo. Os exemplos estão lá quase que a cada página. É a reconstrução da casa da Glória; o desejo de escrever sobre jurisprudência, filosofia, política; o ensaio de suicídio...
Mas porque?
São os atos adiados, interrompidos, desviados, recalcados, falhos, etc. De outro lado, um pequeno mas decisivo grupo de ações, completas e bem-sucedidas, tem o caráter de intermediadas. Ou seja: que não são operadas por Bento (seu presumido autor), mas por alguém que se interpõe entre ele e seus objetivos. Eis uma grande diferença com Shakespeare.
Ao contrário do Hamlet, Bento não pode consumar a ação, uma vez que seus intentos se inscrevem no âmbito daquilo que ele chama de “meus impulsos que nunca chegavam à execução
Um outro traço de sua ação, vamos encontrar na intermediação. Assim, ao livrar-se do seminário, o faz deixando em seu lugar um intermediário; quando cursa advocacia em São Paulo, faz de Escobar o terceiro entre ele e Capitu; ao retornar ao Rio, é novamente Escobar que como seu intermediário, o encaixa numa banca de advocacia respeitada. Ele mesmo, a partir da promessa feita pela mãe, deveria estar no mundo como um intermediário, ou seja, como um padre, intermediário entre os homens e deus.
É por tudo isso que, desde a morte de Escobar, Bento se torna totalmente incapaz de ação, porque já não tem quem lhe sirva de terceiro. Isso fica explícito em seus tentames de promover imaginariamente outros intermediadores, como quando fantasia Otelo administrando uma morte absoluta a Capitu. Sem um intermediador concreto, o único que resta a fazer é atuar pela dissimulação,ou seja naquilo que resulta sempre em nada.
É claro que não estou fazendo apologia à morte ... talvez sim , da apatia .
Entusiasmei-me pela sua fala
"Utopia é esperança e caminho, não é ilusão... O acontecimento não tem autoria, mas não emerge do expontaneísmo; frutifica-se e fertiliza nos múltiplos agenciamentos que alisam a vida e o torna possível."
Assim, é preciso agir em vez de reagir"
Um forte abraço
Adilson, não consigo traduzir de outra forma minha emoção: você pega a palavra, viaja na literatura e nos abre os portais do infinito.Abraços com carinho; jorge
Bacana gostei de ler seu texto, Jorge, e do Adilson. E coloco uma frase rapidinha , daquelas que faz a gente pensar por anos a fio: "um pouco de possível senão eu sufoco" Deleuze sobre Foucault. Estou trabajando, trabajando então não vou poder ficar por aqui. Tchiau. Parabéns pela casa cheia, idéias, amigos, resistências, cinema. Pipoca aqui pipoca ali
beijos
Marta
Marta, a casa cheia esteve cheia de recordações de Marta. Vida pulsante: onde tudo possível;reinvertar-nos na serenidade celebrado da alegria possível a labuta pelos sonhos antes impossíveis.
Abraços coletivos no seu amigo e terno coração; Jorge
...o texto do Adilson trouxe-me, naturalmente, a este teu, eu agradeci... gostei, começando por esse título que é um resumo perfeito das ideais que queres apresentar. Magistral isso: O acontecimento não tem autoria, mas não emerge do expontaneísmo. Fizeste-me lembrar uma frase de Picasso: 'Eu não sei quando a inspiração vai chegar, mas vou procurar que quando ela chegar me encontre trabalhando'. Mantendo uma atitude ativa, de envolvimento com o que acontece à nossa volta, tenhamos mais ou menos poder para afectar o entorno, ajuda a ter vidas com mais sentido, e sensação de controlo das próprias circunstâncias vitais. Que algo tenha que ocorrer não quer dizer que nós não possamos fazer alguma cousa para que ocorra, ou mesmo para nós termos a sensação de que ajudamos... essas sensações, verdadeiras teorias individuais sobre a nossa capacidade de ação sobre o meio, ajudam a termos a sensação (de novo) de sermos protagonistas das nossas vidas. Fizeste-me também lembrar de um experimento no que umas luzes se acendiam e se apagavam aleatoriamente independentemente do que os participantes no experimento fizessem, eles podiam ir premendo os botões livremente. Logo de um pouco os indivíduos chegavam a ter uma teoria sobre a ordem na que havia que premer os botões para que as luzes se acendesses (era uma percepção errada). As atitudes ajudam certamente, e as teorias ajudam a criar atitudes, sejam acertadas ou mesmo não sendo. Foi bom te ler, ajudou a reflexionar... mesmo que o teu texto ia também por outros lados. Abraços desde a Galiza.
Concha, querida, teus exemplos nos alentam na estrada de pensar os acontecimentos como potências que não são matematicamente produzidas, mas que não serão esperadas nouma acômoda e indigesta apatia. As flores brotam expomtâneas, porém, adubadas e regadas as roseiras florescem suavemente, no instante da magia do acontecimento.
Abraços com muita ternura e carinho, Jorge
Jorge, teu texto me fez lembrar um pensamento feliz: "Se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver flores, valeu a sombra das folhas; se não houver folhas, valeu a intenção da semente".Concordo contigo quando dizes que somos semente-fruto da utopia socialista.Quiçá consigamos transformar essa utopia, fazendo com que seja uma realidade feliz!
Bom te ler, viu?
Abraços...com carinho...
Mila, uma alegria poder ir partilhando ideias e sonhos, construindo um novo dia no horizonte da esperança, Paz e alegria, abraços com carinho, Jorge
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