quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

DIÁRIO DE BORDO: ECOS DO TEMPO...

                                 Jorge Bichuetti

A chuva molhou o meu quintal, acordando na terra e no verde a sede de viver... Não, um viver indolente, dado ao vento... As folhas que voaram, se foram... carregando a ternura do orvalho das manhãs, do amor nutrido no carinho maternal da vida que segue harmonizando as noites escuras do luar com o clarão que chega na aurora, urdindo o desejo de movimento e ação... no balé germinativo do amor que se renova pela alegria de dar-se à vida no milagre da frutificação...
Ali, estive... Perto, pareciam viver as estrelas e o luar me fazia sentir que a separação entre o chão e o céu é, tão-somente, um artifício... uma artimanha da nossa mente e coração que teme descobrir que é o infinito na seara da vida que verdeja e floresce... brota celestial no charco, tanto quanto é bela na imensidão...
Os álamos, guardiões do tempo, me contam... o que não vejo... Eles me olham, do alto, com a mesma ternura que a flor se apaixona pelos raios do luar...
Entre divagações poéticas, vi minha Luinha correr... e recolher as folhas que ficaram... Notei o seu carinho e ali vendo os ecos do tempo, pude compreender melhor o mistério do amor...
O desejo não explica o amor... Tanto que no Antiédipo, Deleuze-Guattari chegaram a afirmar que o prazer atrapalha...
Ele atrapalha quando é o território restrito e excludente das florescências do amor e da ternura...
O desejo emerge e se esgota, fugaz e volátil....
O amor perdura, se sustenta, alonga-se se aprofunda na partilha diária onde a ternura, o cuidado, a cumplicidade, o carinho, a doação... vão corroendo os eus e tecendo no entre dos encontros a potência alegre das existências que se realizam num nós...
Amar é dar-se e receber, desalojados do narcisismo... Amar é partilhar e conviver...no vínculo que nasce da solidariedade...
Não é simbiose, nem identificação... É encontro... a alegria de ser para além da solidão vidas partilhadas...
Assim, o amor não germina, longe da escuta e do diálogo, das trocas... dos caminhos percorridos na ternura de ir, lutando de mãos dadas.
O fogo do desejo gera a atração... Mas, amor é o fruto da vida orvalhada na ternura do luar... Onde na escuridão, o olho do outro não nem espelho nem uma miragem idealizada... No luar, os olhares trocados no carinho de estar com o outro... nos permite penetrar nas entranhas da alma e vincularmo-nos, uns aos outros, pelas pulsações dos sonhos que habitam os corações...
Amar é ser um satélite no sonho grávido de estrelas, um do outro... mutuamente...
Assim, ensina-nos as flores orvalhadas nas manhãs que mergulham no sonho dos passarinhos... e os deixam mergulhar na intimidade dos seus próprios sonhos...
O desejo é semente fértil que não germina, longe da ternura e do carinho, da solidariedade e da cumplicidade, que adubam as florações do amor duradouro...

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