Jorge Bichuetti
Estamos acostumados a pensar sob a a égide do raciocínio médico que se inspirou na botânica e classificou normalidade versus loucura e categorizou as doenças , negando o ser humano como vida pulsante e seu modo de ser e estar... Matematicamente, dividiu grupos e subgrupos, criando todo um universo de patologias que nada mais são do que foge a média e a mediana...
A doença vira lesão geograficamente localizada que se traduz num conjunto de sinais e sintomas... Nasce a clínica: normatizante e excludente; alheia a compreensão de somos seres da diferença...
Cria-se o mito da loucura: perigosa, pueril e improdutiva.
Loucura - paixões desenfreadas e vontade descontrolada... O hospício: local de segregação, isolamento e violência, para que humilhados os ditos loucos renunciassem se modo de ser e se submetessem à equipe: paixão sob freios implacáveis e vontade racional e pragmática.
Um momento de urbanização e nascimento da ciência: segregação para liberar a vida que era, agora, necessária no trabalho fabril... Ciência que se absolutiza, negando a poesia e a arte, a magia, o inconsciente, o místico e os sonhos... As outras racionalidades são desclassificados e relegados aos subterrâneos da superstição...
Tudo é normal: a guerra, a fome, a exclusão... Os desastres ecológicos, a favela, a miséria, o fascismo e os microfascismos, o preconceito e a intolerância...
A loucura está no manicómio...
O mundo gira e a ciência entra em crise: já não explica, não resolve e é economicamente inflacionária...
Cresce a luta pelos direitos humanos...
E surge a transformação, a Reforma Psiquiátrica.
Desmistifica-se a loucura e ela pode , então, ser vista: é singularidade e desrazão...
Singularidade e desrazão que negadas se vêem nos rodopios do sofrimento mental.
Assim, cuida-se da existência -sofrimento em conexão com social; e busca-se emancipação, autonomia, libertação... Ela é um emergente que anuncia e denuncia o mundo que vivemos... Ela traz o suprimido e enriquece o cotidiano que se viu alijado da expontaneidade, da criatividade, do sonhar e do brincar, do amar...
No cuidado das crises se torna necessário reinventar a clínica... Uma nova clínica de acolhimento e alegria, de ternura e maternagem, de poesia e arte, de carinho e solidariedade, de cidadania e inclusão social...
Na reabilitação psicossocial, reinventa-se a vida e o mundo, fazendo a loucura caber... e dando suporte para o livre viver.
A clínica antimanicomial tematiza a vida e o socius e se coloca como um espaço de luta pela mudança...
Uma clínica insurgente...
Uma clínica do amor e da liberdade... da partilha e da caminhada onde juntos novos horizontes são desbravados na utopia de um outro mundo onde a vida seja metamorfoseante, alegre e saltitante, nômade, criativa e cheia de compaixão...
Nela, somos todos loucos...pela vida.
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8 comentários:
Jorginho saudades de você, cada vez que leio os seus textos vejo quanto é grande a sua sensibilidade. Quanto aos usuários do Caps admiro a sua luta para o fechamento dos manicômios.
Beijos para você e a Lua! Bons sonhos e boa noite!
Helidamar: dormirei com sua bênção e isso é divino, vamos caminhando pela liberdade e pelo sonho. Abraços com ternura, Jorge
Olá, Jorge. Gostaria de compartilhar com você o endereço de um Portal online que estamos abrindo aqui em Palmas, pela ULBRA. Nele, tentamos o diálogo entre arte e sofrimento, entre existência e sofrimento, entre existência e arte...enfim, um diálogo com a Utopia Ativa. Abraço.
http://ulbra-to.br/encena/
Caro amigo Victor, irei ver e sei que gostarei; por favor, se possível, gostaria quer me passasse o seu blog.
Lhe agraço com abraços de carinho e ternura, Jorge
Jorge, o endereço do Portal é: http://ulbra-to.br/encena/
Grande abraço.
...somos loucos pela vida e ficamos loucos da vida, quando o desrespeito com a loucura segrega o ser humano-poder-de-vida na jaula da exclusão. Beijos
Victor, com alegria irei a tarde, após o CAps ir lá.Abraços cheios de ternura, Jorge
Tânia, o estigma e a exclusão- microfascismos da cotidianeidade - revoltam, repugnam e nos mostram que cuidar é também lutar. Abraços com carinho, Jorge
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