sexta-feira, 16 de novembro de 2012

DIÁRIO DE BORDO: ESTE AZUL NO CÉU...

                                   Jorge Bichuetti

Luinha pulou da cama, cedo... Madrugadeira, a conheço: pensa em festa, encontros, cantigas e risos soltos no vento para que o tempo se curve ante a alegria, tornando-se tempo de de cumplidade entre o chão áspero da existência e o azul cristalino da imensidão, que é templo pagão, lar do olhar de crentes e ateus... 
Olhando o horizonte, o ser humano ora... Conversa consigo mesmo, pensando falar com Deus... E conversando com seu próprio coração, poetiza a vida, emocionando os deuses...
"Viver é perigoso"- ensina Rosa... Mas não viver é naufrágio no oceano do tédio...
Assim, aceitemos o convite do horizonte azul e coloquemos nossos pés na estrada...
Estar na estrada não é, necessariamente, deslocar-se com o corpo físico de um lugar para outro... Caminhar é experimentar, ser tomado por novos sonhos... Ler, ouvir canções, dialogar com os amigos, meditar é caminhar... Caminhar é sair do lugar comum... É desnudar nas entrelinhas da existência novos voos, novos ninhos...
A generosidade solidária é caminho nômade... Pois, nos germina com outras existências singulares... Outramos...
O ego rígido é o avesso da vida dada no caminho...
"Somos metamorfoseantes" -afirma o filósofo Orlandi.
Daí, podemos entender o que vemos no dia-a-dia: egos hipertrofiados conjugam-se com vidas mesquinhas...
Matar o ego não é perder nossa própria singularidade... É deixar-se fecundar pela beleza e novidade que vida do outro nos traz...
Só somos solitários, quando evitamos o povoamento mental que se realiza em cada encontro...
Podemos nos povoar... agigantar nosso mundo interno...
Uma poesia, uma canção... um amigo... uma causa... são incontáveis as possibilidades de povoamento psíquico.
Já dizia Deleuze: " somos todos desertos, povoados de tribos, faunas e floras."
A perda, a partida de um ente querido nos deixa, num primeiro momento, profundamente despovoados...
Cabe, então, extrair vida e encontro das lições inolvidáveis de Rosa: "saudade é ser, depois, de ter"...
Ah! Este céu azul...
O horizonte azul é permanente convite de afirmação da vida...
Não há, entretanto, vida sem a presença do outro... do que cotidianamente chamamos o próximo...
Todos somos próximos no carisma mágico do horizonte azul...
Falta-nos tecer elos, criar vínculos... Inventar redes de vida...
Dizem que vivemos um tempo de solidão...
Miro Luinha e lhe digo que temos uma casa povoada com u'a multidão: passarinhos, rosas, poetas, filósofos, amigos... Cantigas e sambas...
Escuto Benedetti, Lorca, Neruda, Antonio Machado Miguel Hernandéz... Gabriel García dialoga com Mia Couto e Jorge Amado... Clarisse, Meireles, Cora, escutam Mercedes e Bethânia... os tambores tocam... os índios dançam... e os amigos chegam: alegres, carinhoso e ternos... Boa prosa; riso cúmplice... AH! meus amores não cabem no azul do céu; assim, já sei que uma multidão de céus no infinito do amor...


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