TRAVESSIA
Paulo Cecílio
então veio o tempo gelado e
duro
e enterrei meu sorriso na neve.
e meu coração
pedrou.
e corria em mim viscoso caldo
vermelho.
enxuguei todas
lágrimas.
esqueci de mim pra esquecer partidas
e
penetrei no longo inverno
e sob vertigem abismos
píncaros despenhadeiros
teci meu destino com os fios de seda da
juventude que perdia.
e entreguei nacos de minha
carne em silencio,
pra que não ouvissem meu coração
supenso.
esqueci.
esqueci.
deixei meus tênis e camiseta sob uma árvore
seca
e calcei dentes de aço pra viver
assim.
vendo passar a cor de meu cabelos a força de meus
braços
pra cuidar do ninho de seda e
desespero.
onde só as aves
sabem
em meu crepúsculo
quando já
de joelhos olhos baixos
chegas em mim como um raio dizendo
fica!
fica!
ainda há um menino em
ti!
venha!
há sol e derretem-se as águas em caudalosas piracemas.
o solo traz as
rosas que tanto amas. vem!
acabou a guerra.
foram-se todos.
acabou o deserto de pedra e gelo.
vem
florir ainda é outono!
tire esta roupa
molhada!
deixe o sol penetrar tua tez teu corpo
surrado.
e senti tuas mãos quentes sobre a minha pele
.
e caminhei devagar com tuas pernas.
e vôce
dizendo: vem!
vem menino esquecido,
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