Jorge Bichuetti
A idade sempre foi um fantasma. Hoje, ganha a dimensão de um grave problema: no amadurecimento precoce da criança que vê sua infância abortada e no homem maduro e idoso que não desistiu de inventar uma eterna juventude.
Freud via os primeiros anos como fundantes da vida, e este período reelaborado na adolescência, funcionaria como matriz perene do modo de ser e existir, não sendo o homem nada além de uma argamassa de complexos, bloqueios e castrações, ali constituídos, que o modelaria para sempre.
No folclore das crenças populares, a idade do lobo//loba, esteve e está no imaginário da maioria: é uma adolescência tardia, ou a sua repetição, com suas seduções compulsivas como se fora um contra-ponto à inevitável queda do vigor sexual anunciado pelo corpo.
Jung dizia que aos 40 anos, iniciava a vida verdadeira, após uma crise infernal onde o homem enfrentava uma viagem às profundezas do inconsciente e se debatia com todos os seus demónios.
Ele, assim, pensava, entendendo que até esta idade o homem estava imerso no equacionamento dos seus problemas imediatos: estabilidade financeira, construção da família, aquisição de status e estabilidade... Vencido esta etapa, adquirindo ou não o ansiosamente buscado, o homem se depararia com uma crise: o sentido da vida, a vida verdadeira fase às rondas já presentes da morte... Então, viveria a possibilidade da individuação, do crescimento interior e da valoração dos próprios desejos e sonhos.
Toni Negri, filósofo italiano, relendo Deleuze, confere à velhice um valor de grandeza e potência, do novo e das intensidades suaves dos que superaram as ilusões da força bruta e exploram, então, a ternura e a suavidade.
Chega, ele, a nomear de bruto e grotesco, o sexo na juventude. enquanto vê, nos homens e mulheres maduras, uma nova sexualidade e novos vínculos, agora, calcados na sensibilidade, da cumplicidade, na ternura e no carinho.
Para ele, deste modo, o envelhecimento é potência de vida. Potência que nasce da suavidade...
Cada fase da vida, guarda seus encantos e valores, seu brilho...
Negá-las é subverter o caminho da existência,criando, artificialmente, uma fase que já passou ou que ainda não chegou...
Nada do que falamos refere-se a potencialização da qualidade de vida, da intensidade e da estética...
Aqui, discutimos o quanto e como somos alienados, não escutando nosso próprio corpo nem auscultando nossos sonhos e desejos...
A mídia formata um modelo de vida e felicidade, muito próximo dos que procuram o elixir da eterna juventude...
Aliás, nossa vida afetiva e intelectual empobreceu tanto, que comumente não suportamos o vazio quando nosso corpo já não se dispõe as estripulias de uma vida juvenil.
A paixão não se limita pelos anos vividos, muito menos a capacidade amar...
O exercício físico qualifica o corpo e o torna mais flexível e resistente...
Uma boa alimentação é prazer e vida...
Contudo, como envelhecem bem os que amam, pensam, lêem, escrevem, vêem filmes... Cultivam uma boa amizade recheado de bons encontros...
O segredo da paz é a serenidade...
Artefato de saúde e vida, amor e amizade, criatividade e auto-aceitação nos diversos tempos da existência.
... Por uma nova suavidade, lutamos. Jovens e velhos...
E, talvez, um dia, humildemente, já não escravizaremos nosso calendário existencial às maldições do cronos...
Conviveremos harmoniosamente, com ele, mas privilegiaremos a produção do novo e do diferente, dos acontecimentos e dos devires que não se submetem aos ponteiros do relógio, pois se dão no tempo Kairós, o tempo da vida plenificada, onde o instante substitui, igualmente, os minutos e a eternidade.
domingo, 23 de janeiro de 2011
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4 comentários:
lindissima sua cronica sobre enigmas da idade serena idade que de serena a gente sabe que é bem como a paz. toda feita de guerra .ela deveria ser colocada num jornal para ser lida por mais gente. quem sabe voce me permitiria coloca-la no meu blog? lindo tambem é seu final quando voce fala da vida plenificada onde o instante substitue igualmente os minutos e a eternidade atualmente tão ambicionada por mim. santuzza
Santuzza, você não precisa pedir permissão: pode colocá-lo no seu blog.
Foi uma reflexão que me fez muito bem. No mundo, somos sucateados por ideias que valorizam o jovial e os jovens. Foi bom pensar no valor da serenidade, obra do tempo.
Abraços . Jorge
Uma serena-idade que nos chega devagar e nos leva a re-pensar a vida e como você mesmo diz re-inventar, re-viver com esperança e forças para sermos felizes independente do nosso calendário existencial. Como não tenho o dom da escrita te envio este texto lindo da Lya Luft uma das minhas preferidas.
Canção na plenitude
(Lya Luft)
Não tenho mais os olhos de criança nem corpo adolescente, e a pele translúcida há muito se manchou.Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura agrandada pelos anos e o peso dos fardos bons ou ruins.(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)
O que posso dar é mais que tudo o que perdi: doo os meus ganhos.A maturidade que consegue rir quando em outros tempos choraria,busco agradar quando antigamente quereria apenas ser amada.Posso dar muito mais do que beleza e juventude agora: esses dourados anos me ensinaram a amar melhor, com mais paciência e não menos ardor, a entender quando precisam de mim, a aguardar quando há despedida,a dar colo de amiga,e sobretudo força — que vem do aprendizado.Isso posso dar: um mar antigo e confiável cujas marés — mesmo se fogem — retornam,cujas correntes ocultas não levam destroços mas o sonho interminável das sereias.
O texto acima foi extraído do livro "Secreta Mirada", Editora Mandarim - São Paulo, 1997, pág. 151.
Querida, recebo este texto como a terra seca recebe a chuva...Obrigado vamos juntos criar uma tempo de alvorecer!...
Abraços Jorge
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