Caminho do dia
Concha Rousia
Ainda o sonho de ontem me arrepia a pele da memória, descia eu por uma parede imensa por entre pedras barradas, a gravidade ameaçava meu corpo e os objectos todos que eu levava nos meus bolsos... Milagrosamente conseguia descer, ia atrás de um casal de pessoas mais jovens e alegres do que eu, eu ia sozinha mas ia na procura de algo ou alguém... Consegui fechar os bolsos sem deixar cair nenhum dos objectos que eu nem reconhecia... Me desafio e venço no sonho, foi fechar os bolsos, e a parede, que parecia agora mais difícil de descer, pousou-me no chão, lá fui nascer numa sala com uma grande messa onde umas senhoras estavam a provar abrigos novos, de muitas cores, como se fossem de peles de animais com as cores do arco-da-velha... eu não tinha frio, nem compreendia a atitude dessas senhoras...
Saí do sonho por uma avenida escura e solitária, de aí em diante não lembro mais, foi como se voasse, como se me convertesse no próprio caminho... Com esse final do sonho entro agora em casa, a solidez das pedras contrasta com a fragilidade do sonho mesmo que parecia sólido, e contrasta também com a transparência do vento que foi seu canteiro noutros milénios... Ora aqui, neste abrigadoiro herdado, desejo que a tristeza caia do meu entardecer e vá morrer numa noite inexistente... quero sonhos mornos, de banhos nus e solitários, sem abrigos, sem senhoras, quero apenas pedras... Hoje sinto que de cousa nenhuma tenho certeza, e ainda bem, porque se a tivesse já teria morrido... como morreu ontem ou como morreu a noite, mas eu não, eu não morri, nem sei por onde segue o dia... (sempre em andamento)
2 comentários:
Meu amigo, já sabes como eu adoro viver por aqui nesta Utopia, então fico grata e feliz sempre, aqui quero deixar sempre a minha raiz... Beijos meu poeta querido, Concha.
Concha, tua escrita acorda os luares que temos arquivados no coração; abs ternos, jorge
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