Na escuridão da noite, a chuva... As estrelas e o luar ocultos vigiam a madrugada. Eu e Luinha contemplamos nosso quintal, ouvindo a música da chuva que cai, suave, umedecendo o chão... O cheiro das folhas verdes e das rosas molhadas impregnam o ar,, com uma melodiosa poesia... Canta na vida as forças renovadoras do tempo...
Na cozinha, relembro o tempo do fogão-de-lenha: o café quente e o biscoito frito, a prosa...
quando é chuva na aldeia, os índios se reúnem e falam da vida e da história; contos ancestrais da tribo, proezas dos deuses e da mãe natureza, a grandeza e valentia dos heróis...Na minha infância, amontoados na cama de ferro dos meus avós, eramos índios e bichos...A alegria dos pardais ressoava no cirandar das nossos mágicas brincadeiras...
Nosso mundo precisa urgente de ser reinventado: a ressurreição do biscoito frito na gostosura da manteiga de leite derretendo na nossa boca... a volta das cirandas e dos jogos infantis onde outrar-se, nos permitia rir e experimentar a corporeidade de outras vidas... o reunir-se, entre causos e prosas, carinho e aconchego...
O individualismo e a industrialização do alimento, dos brinquedos e do lazer... isolou o ser humano nos confinamentos tristes da solidão e criou um mundo seco, sem magia... sem sonhos...
As guloseimas das Geraes dava inveja aos banquetes dos Reis e dos deuses...
Ser menino não era tão-somente ser pequeno: era a alegria de fantasiar e viajar no tempo e no espaço, na improvisação da vida que se moldava nos voos da criatividade...
Eramos tribo... Movimento e encontro...
Se hoje não sinto a chuva como melancolia paralisante, devo a alegria que persiste aos meus livros e discos, a Luinha e a minha mania de poetizar dores e esperanças, com a alma inundada de poesia e o corpo mambembe, um trapezista no chão...
Escuto a melodia da chuva com a quietude de quem vê a vida fiando seu rosário de fé e magia, na profecia das flores e dos frutos que virão...
Sereno, espero o arco-íris... O sol retornas e varre o mundo e o meu coração, levando no vento as amarguras do ontem... com cantigas que anunciam a chegado do amanhã...
Nunca sei se sou um bicho do mato... ou um homem comum que não impediu o seu corpo de verdejar...
Na chuva, celebro nosso passado ancestral... e, ternamente, alucino num sonho de arte e poesia a beleza do porvir...
Não fujo do agora... o enfeitiço...
Não me entorpeço na chuva... sei que a vida é um permanente recomeço, germinação cósmica, um broto verde na poeira do caminho e outro broto verde no coração da gente...
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