sexta-feira, 16 de março de 2012

DIÁRIO DE BORDO: O QUE PODE UMA ROSA?...

                            Jorge Bichuetti

Acabei de coar o café... Mineiridade na amplidão do cerrado...Ele suaviza meu corpo; ele aquece minha alma... Nostálgico, recordo do pão-de queijo nas manhãs preguiçosas da minha infância... Choveu, a noite esteve toda permeada de sonhos no tamborilar da água no telhado... Agora, o céu nublado se confunde com os desenhos que a fumaça do meu cigarro vai tecendo no ar... Há cheiro de terra molhada; há o roseiral... Nunca o havia visto tão pleno... Há uma multidão de rosas... Mas, os passarinhos ainda dormem... Existem dias que eles se dão aos sonhos... Tecem sonhos... O silêncio é a cantiga do sonho que rodopia, bailando no infinito... uma espera com esperança; uma ânsia serena... A realidade desacorrentada do concreto cimentado na razão...
Luinha quis ver as rosas... Amou o esplendor da vida no nosso pequenino pé de rosas: o roseiral entre álamos...
Ela nem imagina o quanto é amada: nela, o luar e as estrelas brilham num terno olhar de carinho e ternura... mimosa, dengosa... vive entre carícias onde o dar e o receber se mescla numa só tonalidade, o tom maior do amor...
Muitos não acreditam na realidade da vida, palavra e silêncio, versos e cantigas, que surfam alegres no orvalho e no vento que suavizam o caminho... no meu pequenino, mas verdejante quintal...
Amo minhas rosas... São belas e estão nos muitos caminhos da vida...
São orações nas mãos das mulheres piedosas com suas romarias nos maios de fé e esperança no socorro perpétuo que encontram no coração de Maria-Mãe...
São afagos sensuais e apaixonados nas serenatas dos moços que vadiam pelas noites no cio das paixões...
São a ternura nas ramalhetes que vitalizam o caminho na alegria das grandes amizades celebradas na oferta generosa de companhia e compreensão...
E são... como são... a palavra indizível dos poetas...
São magia e poesia que acordam a vida, despertando sonhos...
Gosto de dar e receber rosas...
E minhas rosas, de cacho, brancas... são ecos dos escritos de Guimarães Rosa que nos enternecem e nos enrijecem... ensinando-nos a viver com coragem no riso e na lágrima.... São, também, ecos de uma outra rosa, a guerreira, A Rosa de de Luxemburgo, com suas lutas, sonhos, caminhos de libertação...
Os amores se plenificam na rosa dada que embora seca entre as páginas amarelas de um livro, eternizam o carinho e a ternura...
Ela me parecem singelas, porém, valentes e vigorosas... porquanto na escuridão dos dias de fascismo e morte, os canhões e os fuzis as temem... São rebeldes... Atiçam e ativam insurgências... Marcam o corpo da vida no seu desejo e necessidade de mudança...
Amo-as... porque me acalentam, me inspiram, me subjetivam... um ser para além-do-humano com sede e fome de vida remoçada nos fluxos vitalizantes da compaixão...
Ninguém está só... se possui no jardim ou num livro esquecido... a potência amorosa de uma rosa...
Nossos poderosos e os que dominam no dia-a-dia não sabem o que podem uma rosa... Se soubessem, plantariam na cracolândia, nas favelas, nos acampamentos... nas vielas de dor e amargura... roseirais...
Uma rosa pode... onde falha a palavra e os canhões...
Uma rosa pode... onde abismos e pântanos arquitetam a morte e a destruição...
Armemo-nos com rosas: sonhadas e semeadas nos caminhos da vida que agoniza na espera de uma nova vida, que seja vida-humanização... ternura vital, carícia essencial... amor incondicional...
A lua clareia as noites; o sol ilumina os dias... A rosa é vida que abre claridade nas pulsações viscerais do corpo, que na radicalidade do amor, é todo, todo coração...

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