Luinha me acaricia e me mantém junto dela... Juntos vamos ao quintal... Há uma multidão de pássaros. Silenciosos, parecem a espera... Uma serena espera... Esperam o sol... Pouco a pouco, gorjeiam anunciando o recomeçar do caminho na alegria de um novo dia... Voarão; fabricarão ninhos... Estarão entre flores e frutos... Viverão... Leves, suaves e ternos... Singelos...
Assim, que um começa, a cantoria multiplica-se e as nuvens do outono já consegue esconder com suas nuvens o brilho do sol...
Ficamos ali um longo tempo... Um eterno agora... Um mergulho na beleza da vida...
As rosas se entregam dadivosas aos que a amam...
Os álamos valsam com graciosidade e ternura... Tão altivos e tão imersos na alegria da vida que se realiza no canto dos passarinhos, no perfume das flores, no frescor do orvalho... A vida amanhece com ânsia de ser vida no caminho...
Caminhamos, mas nossos passos acostumam-se e automatizam e seguindo nem sentimos a estrada... Repetimos o dia anterior, como amanhã repetiremos o hoje...
Não entendemos o valor do instante, do agora, da vida pulsando cheia de desejos e sonhos...
Aliás, a muito abandonamos nossos desejos e sonhos... Assim, parece até normal e rotineiro que não escutemos as vozes da vida que cantam nos passos do caminho.
Sabemos de tanta coisa... Quase nada sabemos da vida...
Não sabemos por exemplo que para vida nenhum instante é igual ao outro, cada instante é especial e impar... um vulcão totêmico de possibilidades de reinvenção do destino, da vida real que nos acinzenta os dias...
Caminhamos... porém, não aprendemos a nos guiar pelos clamores do horizonte azul...
Queremos a felicidade, mas a buscamos no nevoeiro das ilusões passageiras...
Queremos crescer e vencer, mas esperamos a felicidade e a vida remoçada na apatia de quem acostumou-se a colher sem semear, a conquistar sem o valor da labuta que unge os triunfos de merecimento e gratidão...
Acumulamos bens que não usufruímos... Buscamos aplausos que não acalentam nem dão acolhimento aos nossos corações...
Caminhamos... seguimos o rebanho. Não perguntamos sobre o verdadeiro sentido da vida...
Queremos o mundo e o conquistamos... E só muito tarde, começamos a ver que o mundo é vazio... Que o próprio mundo já nada cansado e exausto de ser somente a realização narcísica de alguns, sustentada pelas lágrimas da multidão dos excluídos e tristes...
Caminhamos... para na exaustão perceber que rodopiamos em torno de nós mesmos... Não buscamos ir além... Encontrar-se e tecer redes de ternura e amizade... Semear floradas de vida nova...
Assim, caminhamos sem sair do lugar, e acabamos encismesmados, tristes e ansiosas... Vivendo sem a vida... pois a vida floresce no sentido que lhe damos...
Caminhar é mais do que andar, rodopiar, seguir sem direção...
Caminhar é viver, impregnando com nossos passos a própria vida, dando-lhe cor, sabor e sentido...
Tecemos nosso destino...
Todavia, apáticos, acomodados e fatalistas... Não nos conectamos com os anseios de mudança e vida que pulsam luminosos no coração da própria vida...
Consequentemente, sempre nos pegamos cheios de angústia, vazio e tristeza...
Urge acordarmos... Urge compreendermos que a vida é um caminho de produção de sentidos... Um caminho de inovação e de procriação de vida nova...
Eis a grande diferença entre vida ativa e reativa... Eis a nossa ruína: caminhamos reativos e no rebanho cinzento da mesmice e assim agonizamos, minuto a minuto, na asfixia de uma vida vegetativa... Pobre de desejos e sonhos... Pobre de vida na potência da alegria que é tecida nos encontros de ternura e solidariedade...
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