Jorge Bichuetti
... Uma lágrima cai. Um sentimento de solidão. O horizonte parece cinza; e o sol se põe nublado sem nuvens. Um azul que já, neste momento, não guarda a mesma alegria dos outros, vistos na esperança da luta e da mudança; luta e mudança que nasceu sonho e se foi tornando realidade, pouco a poco, no heroísmo dos que quiseram no mundo semear floradas de libertação.
Caminhamos, conquistamos... a loucura já é não uma vespa perdida na escuridão dos asilos.
Construimos com solidariedade e amor espaços de cuidado e liberdade, ternura e vida singular.
Já cantamos, celebramos cada passo desta longa caminhada que se encontra ainda longe do seu fim...
Sorrimos, nos abraçamos... Poetizamos nossas festas... Louvamos cada coração que pode viver as agruras da sua crise longe dos muros e da solidão de um hospício.
Como sorrimos!... Porém, hoje, choramos...
A dor é dor e fere... no que se arrasta pedindo cuidado; como também, é dor nos nossos corações de cuidadores e militantes do sonho de vida nova, amorosa e livre.
Choramos a perda... Já nos sentimos mais sozinhos...
Choramos a perda de uma guerreira, altruísta e valente, destemida e dedicada, um coração pioneiro no amor aos que sofrem na solidão da loucura uma morte civil, antes decretado, e que, para eles, cuidamos juntos de criar espaços de viver e sonhar...
Guimarães Rosa diz que pessoa não morre, volta a tornar-se encantada.
Sandra Nascimento, a águia da solidariedade, ontem, depois, de uma longa luta com o câncer, se encantou... Partiu... E foi encantada para o azul, que um dia voltaremos, já sem estas lágrimas que nos inudam hoje, a ver, claro e transparente, cheio de estrelas e entre outras estrelas o coração reluzente da nossa eterna amiga e companheira de jornada: Nossa Sandra deviu-se estrela...
Choramos... A Reforma psiquiátrica, audaz e corajosa, que se viu muralha, hoje, se sente frágil e chora...
O Tocantins e Gurupi, terra de chuvas torrenciais, e calor abundante... Cerrado de plantações e gado brejeiro... Povo de cantorias e festas... Hoje, vive inundado por nossas lágrimas. E faz frio... Faz silêncio; até os passaros que partiu uma heroína da luta diária pela vidae pelos excluídos...
Chora, o CAPS... Chora nossa loucura: nossa sofrimento, nos usuários anônimos, que nela encontraram sem pre o acolhimento e a desefa da cidadania, da liberdade, do direito à diferença e do apoio para a necessária reinvenção de suas vidas... chora nossa loucura, loucura de amigos, de terapeutas e companheiros de luta, choramos nossa solidão aumentada, a ausência da que era nas nossas construções arrimo e alicerce, voo e sonho...
Recordo de outros dias em que choramos: choramos a insensibilidade e o arbítrio, a postura manicomial, que por um longo período fechou as portas do CAPS de Gurupi... e relembro com ternura, da valentia da nossa Sandra na luta por reabri-lo... Por reerguê-lo para que os que sofrem na dor da loucura ali encontrassem um porto seguro ante o mar revolto da própria vida.
Junto coma sua valorosa equipe, o reabriu e o sustentou, fazendo dele um recanto de liberdade e paz, amor e compaixão...
Muitos na dor da saudade, esperam uma carta dos que partem; eu gostaria de poder escrever e num bilhete pedir: Sandra, não nos permita covardes e desanimados no enfrentamento dos vassalos da crueldade, do manicômio e do arbítrio; nos anime e nos inspire para que sigamos honrando a sua vida, com um cuidado amoroso, carinhoso, terno , libertário e de compaixão; não nos deixe, jamais, fugir da caminhada... Inspire-nos a avançar, com o seu exemplo que permanece em nossos corações, rumo à construção de uma sociedade sem manicômios... Ajude-nos a lutar todo dia pela vida e pela liberdade... Receba nosso abraço e que os anjos do infinito cuidem do seu coração lhe dando todo amor que ilumina a vida...
Eu sei que o azul voltará... Nossas lágrimas secarão e a dor passará... Nunca deixaremos de sentir sua ausência, mas lhe preservaremos presente na lembrança das lições , da sua raça e garra que haverá de nos manter firmes e ativos: POR UMA SOCIEDADE SEM MANICÔMIOS; POR UMA NOVA TERRA, POR POVO POR-VIR... E pela eternidade da amizade, entre nós e com os que sofrendo nos pedem no caminho e no cuidado a audáciade nos devir Sandra.
quarta-feira, 23 de março de 2011
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10 comentários:
Jorge, sinto muito pela perda da sua amiga Sandra. Muito duro perder amigos. beijo Marta
Meu caro mestre; não conheci Sandra
,mas eu a estou chorando com você.Ontem a Raissa na sessão espirita de Peirópolis falou sobre os chamados prematuramente às vezes até muito jovens mas que já concluiram suas missões em Gaia e por isso são escolhidos.Isto não nos impede a tristeza mas você continuará "a semear" floradas de libertação"e o sonho de vida nova,amorosa e livre". Santuzza Nós precisaremos mais tempo para lapidar nosso "diamante", para um dia na luz nos perdermos e nela nos encontrarmos.
Marta, obrigado pelo carinho... As perdas de amigos nos são dores difíceis, pois, nos deixa com um sentimento de despovoamento.
Caminhemos... Abraços com muito carinho, Jorge
Santuzza, a vida segue rumos que não sabemos precisar sua lógica. A Sandra era e é uma guerreira, com quem muito aprendi... semeará noutras paragens, agora, corageme vida.
Abraços com ternura, Jorge.
Não a conheci, mas pela sua descrição e relatos, emocionei-me muito mesmo. O Jorge Saes deixou um comentário para você lá Degrau Cultural, após o seu. Beijos
Jorge todos aqui da equipe estamos muito trites mas sabemos que ela esta ao lado do pai. É ela era uma pessa guerra luatadora um grande abraço.
Tânia, era uma grande guerreira, cheia de vida e sonhos. Com muita vibra na defesa dos portadores de sofrimento mental, um grande coração... Vejo loguinho o degrau...
Abraços com ternura, Jorge
Maria, tentei ligar... Não consegui, dê em todos um abraço. diga-lhes da minha tristeza e minha solidariedade. Gostaria de estar aí. Ela era a guerreira cheia de raça, dignidade e vida...
A admiro muito.
No alto, ela vibrará o mesmo amor...
Abraços com a ternura e o carinho, Jorge
Jorge,
Um abraço amigo pela perda da Sandra, apesar de não a ter conhecido.
E sua saúde tudo bem?
São 3.26, acho que agora vou dormir.
Sair da solidão que me faz bem na atual conjuntura.
Com sua permissão desejo-lhe uma boa noite meu amor, De
De, que a vida lhe seja paz, alegria e serenidade, abraços, Jorge
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