quarta-feira, 12 de outubro de 2011

DIÁRIO DE BORDO: CAIS E MAR...

                                          Jorge Bichuetti

Céu azul claro; poucas estrelas ali recordam a noite passada... A aurora chega de mansinho... A Luinha dorme e sonha... Os passarinhos estão aninhados... Nem o galo cantou... A natureza pressente quando é feriado...
O café me anima e escrevo... Já não me pesam as dores e o cansaço; o clima seco e a falta de ar...
O verde dos álamos me encoraja; o cheio do orvalho me enternece...
Por um minuto, penso que coragem e ternura somam e formam a realidade íntima necessária a caminhada...
Nem apatia e medo; nem brutalidade e rigidez...
Os pios das aves vadias iniciam a grande orquestra do alvorecer...
Hoje, é o dia das crianças; celebro, intimamente, a criança que me habita...
Mas, logo, me ponho a refletir nos dilemas da humanidade e retomo o tema da coragem e da ternura...
A apatia e o medo geram uma humanidade covarde: humanidade acomodado e temerosa; sempre no caminho seguro da vida contido... sempre no cais... Nunca humanidade guerreira que olha o mar e seduzida pelo azul do infinito, se torna aventura, busca, produção de vida no ondear dos sonhos que nos induzem a querer ousar, ir além, desbravar o horizonte...
Reprimidos não aventuramos em novas experiências... Para, então, justificar nossa timidez e covardia, nos enrijecemos e nos brutalizamos... Perdemos flexibilidade e ternura... Medrosos, não assumindo nosso medo, passamos a julgar como inconsequentes os que vencem o medo e se jogam no mar...
Ante os que se aventuram no navegar, árbitros cruéis, lançamos sentenças excludentes: eles são inconsequentes; infantis, rebeldes...
E os que se aventuram no mar, muitas vezes, para lograrem uma auto-afirmação desprezam o valor do cais... O cais é covardia cristalizada, o medo instituído...a vida evitada...
Contudo, a vida é coragem e ternura; cais e mar...
"Navegar é preciso"; porém, o cais é o porto seguro das aventuras no mar... E o navegar que dá sentido ao cais...
Ambos, se afirmam numa relação de mutualidade...
A aventura inovadora do hoje tem como ancoradouro a experiência incorporado do ontem...
E a  experiência vivida só não é objeto de museu, se é capaz, de ternamente, ancorar a ousadia das novas aventuras...
Esta singela reflexão nos parece necessária para nos guiar no dia-a-dia, tanto na relação que vamos efetuar com nossos desejos e sonhos, como em relação aos outros que chegam ávidos de novas experimentações...
O dia nasce... Um novo dia...
Nele, a vida... vida de cais; vida de mar... A ternura do cais ancorando a coragem do mar... A ousadia do mar na segurança amorosa dos cuidados do cais...
Mar e cais - " a vida é etecétera", já dizia Guimarães Rosa...
Separar numa dicotomia beligerante o cais do mar é apostar no naufrágio...
Juntá-los, uni-los, conjugá-los é apostar na potência da vida que na diversidade se enriquece e se torna forte e potente ante os fantasmas da morte...

2 comentários:

OceanoAzul.Sonhos disse...

Gostei muito de ler.

abraço
oa.s

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

OA.S: seu carinho me dá forças... abraços, jorge