sexta-feira, 9 de setembro de 2011

DIÁRIO DE BORDO: SONHOS DO LUAR

                                        Jorge Bichuetti

A minha Luínha me acompanhou, minuto a minuto, inseparável... me ensinou a ser companhia. Os passarinhos voavam no quintal e ela, resistindo, seu instinto, não cedeu ao desejo instintivo de jogar, brincar... Deitada do meu lado, me acaricia com seu corpo, aquecendo minha vida. O carinho é o calor que nos vitaliza nos momentos de fragilidade física... Hoje, quando me levantei... quis que eu permanecesse quieto; não conseguindo aqui está... com seus olhinhos jaboticabeiros, me vigia... Estive com ela no quintal, espiamos as estrelas... sentimos a brisa... e como se olhássemos o infinito do cume dos álamos... inventei , pra lhe ninar, histórias do luar...
O luar é o espelho onde refletimos as dores, nossas e da humanidade. Olhando, pensamos...
Há muitos modos de pensar...
Às vezes, pensamos, atolados nas lembranças do passado. Nostálgicos, remoemos culpas e ressentimentos... ou caímos nos despenhadeiros do se... numa tentativa de remendos e alterações do que já se foi... O passado é lição vivida e aprendida; mas é o que passou e já se vê sepultado no baú  dos guardados do que é nos impossível alterar...
Doutras vezes, vemos no luar o presente: o tempo presente, com suas lutas e sonhos... possibilidades de agir.. de intervir... de dar rumo ao nosso existir...
Vivemos, quase sempre mecanicamente, não percebemos que vamos dando rumo à nossa vida... escolhendo caminhos e sonhos... buscando materializar ideiais e cultivando ideias que nos alimentam nos painéis que desenhamos como sentido de vida... Os desenhamos no horizonte. O horizonte é depositário dos nossos sonhos...
O sonho não é uma fuga do real.... O sonho não é uma compensação do real...
O sonho é a magia de criar o real almejado... Por isso, ele é projeto...
As dores do ontem nos fixam num tempo que já se foi...
Os projetos dão sentido ao presente e alimentam as lutas, íntimas e sociais, que funcionam como ponte, passagem... vias para o alvorecer de novas realidades, desejadas-sonhadas... buscadas no caminhar pela vida, lutando por descolar o nosso corpo-vida das repetições do ontem e inaugurar um novo modo de existir e viver...
A vida é mutante, metamorfoseante; porque igualmente o somos...
Ainda na ressonância da força do Grito dos Excluídos, penso que no horizonte existe uma nova vida que clama, um clamor da vida por uma nova realidade...
E ali a vida em abundância fala de ternura e paz, compreensão e doação, partilha e solidariedade, liberdade e amor... 
A Luínha me olha e o sua meiguice me anima a crer que a ternura é a força insurgente que anima dos desenhos do horizonte...
Quando somos espoliados na exploração e na exclusão, nosso corpo danifica-se... porém, permanece vivo e pode retomar o caminho... contudo, se não nos permitem sonhar... ficamos nocauteados, inativos... vegetativos...
Neste sentido, me inesquecível o grito dos indignados da Democracia Real da Espanha: " Se não nos permitirem sonhar; não os deixaremos dormir"...

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