quinta-feira, 3 de março de 2011

DIÁRIO DE BORDO: CRISE E NOVOS CAMINHOS...

                                                                               Jorge Bichuetti

A madrugada silenciosa  nos dá um contato íntimo com a vida que estamos vivendo, de fato. Seus encantos, seus limites... Suas potências, suas frustrações... Nossos sonhos vivos e pulsantes e os outros que os esquecemos, negamos, e, que, agora, vegetam, em nós, adormecidos... O escuro clareia. Muita luz cega...
Vivemos tão atropelados pelas mazelas e obrigações do cotidiano que falamos muito, porém, raramente, dialogamos com a nossa própria vida.
Ela é e pronto. Seguimos, acelerados, no cumprimento das tarefas que ela nos impõe... E ela nem sempre encontra espaço para divergir, propor, questionar, sugerir, restringir e inventar-se vida nova.
Assim, vamos...
                                                      ***
Minha pequena Lua me escuta, agora, e prevejo problemas. Ela me parece pela alegria revelada no bailado do seu pequenino rabo, e dos pulos acrobatas, que algo gostaria de falar... Penso que me lendo, através da minha leitura em voz alta que devo enfrentar pelo amanhecer sua própria rebelião.
A noite sem estrelas e com um luar tímido e difuso cria a presença de amigos que não julgo apropriada a uma pequena criança: Edgar Allan Poe e Horacio Quiroga, autores do trágico e do mágico, com pinceladas de realismo que nos deixam assustados.
Não venta... a chuva passou e o ar se mantém parado, espiando nossas vidas.
Os álamos não dançam sua coreografia serena e suave, nem os pássaros cantam sua sinfonia de alegria para o despertar...
Só, não consigo fugir da vida que acordou com alma de sindicalista.
A lua brincou...  E não resistiu, dorme aninhada , junto de mim, como se , assim, eternizasse nosso vínculo de amizade e mor.
A vida fala...
                                                       ***
Quase nunca a escutamos.. Aliás, pensamos que somos um e ela, um outro passivo.
Mergulhados na rotina e asfixiados pela mesmisse, caminhos robôticos, sem tomar consciência que a vida é uma permanente turbulência. O ser nunca está dado; ele está sempre em devir.
Assim, o negamos e permanecemos repetitivos e submissos a um cristalizado modo de ser e existir.
Deste confronto, silencioso, nos pródromos da seu acontecer, emergem as crises.
A crise é um grito da vida, um esperneio, uma rebelião.
A crise nunca é um fato restrito ao fisiologismo da nossa biologia.
A crise é a falência da nossa existência restrita, contida, uniforme e inflexível...
A crise é um questionamento do status quo, introjetado, e que reproduzimos no dia-a-dia...
Há, virtualmente, um novo e uma mudança que serpenteiam e desejam vir ao real, atualizando-se, e modificando o nosso modo de ser e existir.
Vivemos, longe, da potência da vida que nos fez ser metamorfoseante.
Somos o previsível, o duro, o repetitivo... E as crises emergem, porque este modo de existir e ser restringe e quase sempre nos mortifica, pois não conseguimos nos realizar, nem administrar os complexos dramas e tramas da vida externa e íntima.
A crise, falado pelo corpo ou gritada pela alma, é um levante, uma rebelião... Um caos doloroso e perigoso que, contudo, chega para potencializar a vida e nossas andanças pelo mundo com os ventos  libertários do novo e da mudança.
A crise, assim, nada mais é do que um analisador do que temos feito de nós e do nosso corpo-vida pode se o liberarmos para a ousadia da sua própria reinvenção.
Comumente, a negativamos, dando-lhe o nome de falência, derrota, doença...
Ela é, tão-somente, a vida desejando-se potencializada e nova, intensificada e diversificada, transmutada e liberta das correntes de evitação do novo.
Ela é encruzilhada... Terra de ninguém... Onde dançam os redemoinhos...
Nela, mora o Homem-Travessia...
Urge, então, cuidarmos das suas angústias e dores, sem acorrentá-la, mas, sim, investigando e experimentando o novo e a mudança que ela anuncia nos seus estertores...
Crise não se cura; se a auscultamos, buscamos nela nossa vida plenificada e os devires que nos trarão novas auroras e novos horizontes, quebrando o cinzento do nosso existir...

4 comentários:

CLARA disse...

Seus textos para mim são sempre um pouquinho de saúde!!!

"A crise, assim, nada mais é do que um analisador do que temos feito de nós e do nosso corpo-vida pode se o liberarmos para a ousadia da sua própria reinvenção".
Com carinho
Clara

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Clara, fico feliz... é isso: da crise podemos tecer vida nova.
agora, o seu blog me alimenta muito: as poesias, as ilustrações, tudo cheio de vida e muito belo.Sempre apareço,
Abraços com cainho, Jorge

CLARA disse...

Pois faça dele um cantinho aonde com certeza você é muito bem recebido, seus comentários tem sido de grande valia para mim.
Muitos abraços cheios de confetes e serpentinas Abraços

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Clara, seu blog é uma casa da ternura, ali todos se sentem em casa. Abraços, Jorge