segunda-feira, 21 de março de 2011

DIÁRIO DE BORDO: ONDE CANTA O SABIÁ...

                                                            Jorge Bichuetti

Escrevo, com as mãos inquietas por ouvir o que fala o meu coração... Sinto, com o coração ansioso por saber onde andam e o que fazem as minhas mãos... Eles se encontram e se entendem, porém, nem sempre noto o que ou quem faz esta mediação... A vida se compõe de planos, linhas e fluxos que se entrelaçam numa rede de sons, cores, cheiros, palavras, afetos, sonhos, magias, poesias, canções...
E outros n elementos que paro, vendo que minha casa... Meu canto: a Lua e os álamos, meus livros e os amigos... Meus sonhos e minhas ações...
A Lua se cansou... Contudo, não deixa de brilhar... Dormindo, suspira como se desejasse permanecer no diálogo.
A roseira se prepara para fabricar novos cachos de belas rosas, brancas como o luar de ontem, quanto a outra lua se acercou da Terra, somente para nos ver e nos amar...
O amor pulsa, brilha, canta e encanta, caminha e sonha, ele é magia e poesia...
Está no vento que sopra e fazem as folhas bailarem...
Está na pedra que silenciosa provoca o olhar humano e nos leva a sonhar com casas e escadas, pontes e estátuas...
Está no homem... que o vê e o teme; o deseja, mas foge... Êta, bicho medroso! Tem medo da loucura e tem medo de amar... Talvez, pressinta que ambos, a loucura e o amar, sejam linhas, planos e fluxos que o levem para um além, para um a mais, para um demais... para um viver e existir onde ele terá que aprender a ser uma metamorfose ambulante, um permanente devir, um ser no não-ser e não-ser no ser...
O ego monolítico e monocromático é um porto seguro; porém é uma prisão. Nos mantém distante das nossas potências e da nossa nossa própria condição de inconclusos, projetos inacabados, obras em construção.
O diálogo entre meu coração e a minha mão é um analisador... O vão anseio de autoria, de total domínio sobre si...
Não somos, nem estamos: nos movemos e nos movemos, agenciados pelos entres que constituem as conexões de vida que buscamos ou as que nos buscam...
Não há amor fora do movimento... Pois um vínculo com o outro nos coloca num processo mútuo de mudança e reinvenção. A  paralisia só ocorre quando anulamos as potências inovadoras do amor e o transformamos em relações parasitárias: simbiose e dependência, totalização e possessividade.
A loucura é a desterritorialização máxima... Nela, o movimento só para se o trancafiamos num hospício ou numa camisa-de-força de contenção química...
Do que fugimos?... Do novo, do desconhecido, do inusitado...
O que preservamos?... Nossa torre de marfim: escura ou clara, de risos encantados ou de doídas lágrimas... Todavia, um lugar  restrito, mas conhecido; onde já dominamos o script, o roteiro do papel que desempenhamos no romance da vida.
As crises geram novas necessidades e nos situam perante desejos e sonhos, antes não percebidos...
Por medo do novo, as cristalizamos como sintomas, patologias, enrijecimentos, vidas estropiadas...
Somos metamorfoseantes... Não precisamos ter medo, pois, como assinala Guimarães Rosa, a "tempestade não destrói o mar"...
Podemos nos reinventar... Podemos transformar o mundo...
Não tenhamos medo do que sente o nosso coração, nem do que realiza as nossas mãos... Basta que os situemos nos entres de afirmação da alegria e do amor, da liberdade e da vida, da solidariedade e da compaixão...
Somos muitos... Planos, linhas, fluxos... Exploremos nossas multiplicidades...
Não receemos a diversidade em nós, nem no mundo...
Nossa alteridade se dará na ética de viver, cuidando de si e da vida, para que tudoe todos, plenifiquem as potências libertárias do amor e da loucura criativa.
Não a loucura do hospício, mas a do nomadismo que se move sem medo da magia imanente aos sonhos e à poesia... Deixemos, então, nossos corpos imersos no mar de sonhos e poesias que ondeiam a invenção de um novo dia. Vivamos sem medo de ser feliz...

6 comentários:

Tânia Marques disse...

Lindo tudo isso que você escreveu, mais uma vez, só para variar um pouquinho. É bem assim que lhe vejo, um refugiado de si mesmo. Preste atenção, há vida lá fora, há lua e Lua, há álamos, há roseiras, há amizades, há sonhos, há música, há sentimentos, há amores libertários, não somos todos iguais. Mas eu lhe entendo, amar para você, inevitavelmente, passa pela posse (sua ou do outro em relação a você). Em certa medida, não lhe tiro a razão, a posse enclausura, poda, limita, embarga as ações revolucionárias. A não ser que...

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Tãnia, a não ser que se invente uma relação de libertação; que parece possível, uma nova suavidade, uma vida compartilhada no aconchego e na alegria. um estar sem possuir; um ter sem diluir-se... abraços com ternura, Jorge

Tânia Marques disse...

Concordo plenamente com você.Mil beijos!

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Tânia, mil beijos... e muitos gostariam de saber um pouco sobre modernidade diluída, que oriento? Abraços com carinho, Jorge

Anônimo disse...

Dr. Jorge olhei no youtube e achei o livro: Modernidade Liquida

de:Zygmunt Bauman sociólogo polonês

espero que o nome do escritor esteja certo.

Muito legal

Beijos da Denise
O livro tem que ser encomendado meu querido!

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Denise, é este o livro, sim... Abraços e uma serena noite, com paz e alegria; Jorge